O Rascunho de fevereiro, já disponível para assinantes (assine aqui) e com arte de capa assinada por Dê Almeida, publica entrevista com Diamela Eltit, cujos romances Jamais o fogo nunca e Forças especiais estão traduzidos pela Relicário.
Na conversa, a chilena discute o processo de criação dos dois títulos citados e passeia por assuntos urgentes, como sua participação em um grupo artístico que agiu contra a ditadura de Pinochet, a posição da mulher na sociedade e o que pode a ficção frente à realidade.
“Não ouso dizer que há um benefício para a literatura quando se desencadeiam pandemias ou ditaduras, mas se pode textualizar e tornar visíveis a angústia e a destruição”, reflete a autora.
Outro bate-papo da edição é com a mineira Maria Esther Maciel. Na seção Inquérito, a autora de Pequena enciclopédia de seres comuns conta que sua relação com a ficção começou na infância, quando ela subia em árvores para contar histórias para mangas e goiabas — até evoluir para o contato com a poesia de Drummond, momento em que se deu conta de que queria ser escritora.
Ensaios
O quão modernista ainda somos? é o que questiona o pernambucano Lindoberg Campos em um ensaio sobre a Semana de 22, que completa 100 anos em fevereiro. Para o autor, um dos encontros de artes mais significativos do Brasil nos legou uma complexa reflexão sobre a nacionalidade, mas deixou em aberto questões ainda urgentes hoje, como nossa herança africana.
Em outra análise de fôlego, O inesgotável sol de Camus, a curitibana Marcella Lopes Guimarães visita os ensaios de Bodas em Tipasa. Na obra, o franco-argelino — vencedor do Nobel de Literatura de 1957 e morto três anos depois, em 1960, num acidente de carro — se mostra para muito além da condição de “profeta” do absurdo.
Uma polêmica presença internacional se faz presente em Os monstros das irmãs Brontë. No ensaio, traduzido por Luis Eduardo Campagnoli, o inglês G. K. Chesterton (1847-1936) analisa alguns aspectos da vida e obra de Charlotte e Emily Brontë, autoras de Jane Eyre e O morro dos ventos uivantes, respectivamente.
Resenhas
As obras nacionais analisadas na edição são Sonetos de amor e sacanagem, de Gregorio Duvivier, e Gente rica: cenas da vida paulistana, de José Agudo.
Sobre a primeira, em O que importa não é o resultado, André Argolo diz que o autor carioca aponta seu aguçado olhar para o mundo e mostra que, apesar de coisa séria, poesia não precisa ser chata.
Já em A risível elite, a respeito do romance de Agudo, a paulistana Ana Cristina Braga Martes demonstra como o autor mergulha no cotidiano de famílias abastadas do início do século 20 e visita suas ideias mirabolantes para o futuro do Brasil.
Autores norte-americanos também marcam presença no número 262. No texto No coração da loucura, o paulista Arthur Marchetto visita o livro Dez dias num hospício, de Nellie Bly (1864-1922), uma pioneira do jornalismo investigativo que se infiltrou em um manicômio para denunciar brutalidades praticadas contra a população vulnerável do local.
Em O brilho e o triste fim, o mineiro Bruno Nogueira mostra como o volume de entrevistas Um antídoto contra a solidão, organizado por Stephen J. Burn, discute a trajetória, as obras e o suicídio, em 2008, de David Foster Wallace — mais conhecido pelo calhamaço Graça infinita, de mais de mil páginas.
Quem fecha a seção americana é Toni Morrison (1931-2019), cujo romance Sula é analisado por Giovana Proença no texto Distante do sonho americano. Na obra, ambientada no período entreguerras dos Estados Unidos, a vencedora do Nobel de Literatura de 1993 discute liberdade feminina e discriminação racial.
Na ala europeia, o português Afonso Reis Cabral tem seu romance Pão de Açúcar resenhado por Gabriela Silva. Em A sombra da perversidade e do silêncio, a gaúcha mergulha na história do livro: a de Gisberta, travesti brasileira assassinada brutalmente em Portugal.
De volta à América Latina, para fechar as resenhas da edição, Paulo Paniago visita o livro E por tudo olhar, nada via, de Margo Glantz. Na obra, a mexicana reúne diversas notícias para criar um inventário do absurdo humano em múltiplas dimensões.
Colunas
Em seus Cadernos de leitura, Fabiane Secches escreve sobre a adaptação cinematográfica do romance A filha perdida, de Elena Ferrante, que estreou na Netflix há pouco tempo e tem suscitado inúmeras discussões com relação à maternidade e ao papel da mãe.
“Por tanto tempo e ainda hoje, o modelo de mãe da cultura ocidental foi Maria, a sofredora, a virgem. Ultrapassar esse paradigma parece ser um longo caminho”, escreve Fabiane.
E em seu texto do mês, na coluna Sob a pele das palavras, Wilberth Salgueiro analisa o poema Verdade seja dita, de Mel Duarte — surgido em 2014 como poesia oral e que faz parte, agora, da antologia As 29 poetas hoje, organizada por Heloisa Buarque de Hollanda em 2021.
A edição de fevereiro de 2022 ainda traz colunas instigantes de Alcir Pécora, Eduardo Ferreira, João Cezar de Castro Rocha, José Castello, José Castilho, Luiz Antonio de Assis Brasil, Nelson de Oliveira, Nilma e Maíra Lacerda, Noemi Jaffe, Ozias Filho, Raimundo Carrero, Rinaldo de Fernandes, Rogério Pereira e Tércia Montenegro.
Inéditos, traduções e sugestões
Três contos inéditos estão no Rascunho de fevereiro: Rola a bola, de William Novaes, O viaduto mais íngreme do mundo, de Guilherme Azambuja Castro, e Quando conheço, sinto que não pertenço e me perco, de Clarissa Comin.
A editora de poesia brasileira, Mariana Ianelli, seleciona versos de Álvaro Miranda, Carla Andrade, Ludmila Rodrigues, Paola Schroeder e Wagner Schadeck.
E, em sua colaboração do mês, André Caramuru Aubert traz para o português poemas do norte-americano Ed Dorn, associado à escola Black Mountain. O tradutor explica que, apesar da imagem pública de “caubói durão”, o autor de Illinois escreveu com “forte lirismo”.
Dentre as 16 recomendações do mês, o Rascunho sugere para os pequenos O caderno dos pesadelos, do mexicano Ricardo Chávez Castañeda, e o romance Aqueles olhos verdes, do experiente jornalista e ficcionista Trajano Reis, para os leitores mais experientes.
Histórico
O Rascunho foi fundado em 8 de abril de 2000 pelo jornalista e escritor Rogério Pereira. Com sede em Curitiba e distribuído para todo o Brasil e exterior, é nacionalmente reconhecido pela qualidade de seu conteúdo.
Publica ensaios, resenhas, entrevistas, textos de ficção (contos, poemas, crônicas e trechos de romances), ilustrações e HQs. O conteúdo mensal aborda a produção dos principias nomes da literatura brasileira e estrangeira. Assine aqui o Rascunho.