Profissão de verdade

Socorro Acioli: "Quinhentas palavras bem escolhidas é minha meta de um dia produtivo"
Socorro Acioli, autora de Sobre os felizes
01/07/2020

Apesar de ter sido desenganada aos oito anos de idade, quando lhe contaram que ser escritor não é profissão de verdade, Socorro Acioli não se deixou abater pela notícia — não só por ter lançado vários livros ao longo da vida, em diferentes gêneros, como por ter se dedicado academicamente às letras. Mestre e doutora em Estudos de Literatura pela Universidade Federal Fluminense, a escritora cearense foi aluna de Gabriel García Márquez em uma oficina de contos ministrada em Cuba e bolsista da Biblioteca Internacional da Juventude de Munique, na Alemanha. De sua extensa produção infantil, destaque para Ela tem olhos de céu, vencedor do Prêmio Jabuti de 2013. Como romancista, lançou A cabeça do santo (2014) e foi traduzida para o inglês e francês. Sua publicação mais recente é a reunião de crônicas Sobre os felizes (2019), veiculadas originalmente no jornal O Povo.

• Quando se deu conta de que queria ser escritora?
Ainda criança, com oito anos. Mas me disseram que não era uma profissão de verdade e eu desisti.

• Quais são suas manias e obsessões literárias?
Ter desejo de comer o que os personagens comem. Por dias.

• Que leitura é imprescindível no seu dia a dia?
Romances. Um físico e um em e-book, ao mesmo tempo.

• Se pudesse recomendar um livro ao presidente Jair Bolsonaro, qual seria?
O espelho índio, do Roberto Gambini.

• Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
Sozinha, em silêncio. Mas já escrevi de muitas maneiras, pela necessidade e pressionada por prazos.

• Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Na rede da minha varanda, à noite.

• O que considera um dia de trabalho produtivo?
Quinhentas palavras bem escolhidas é minha meta de um dia produtivo.

• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
Ler um capítulo que acabei de escrever. E gostar.

• Qual o maior inimigo de um escritor?
Arrogância.

• O que mais lhe incomoda no meio literário?
Arrogância.

• Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Stênio Gardel, que lançará seu primeiro romance em breve.

• Um livro imprescindível e um descartável.
A obra completa de Raduan Nassar é imprescindível. Os manuais de eletrodomésticos são descartáveis.

• Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
Quando o narrador está mais interessado em ensinar suas lições pessoais do que construir o edifício da ficção.

• Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Difícil dizer. Até as coisas que eu detesto, justo por detestar, podem servir de matéria literária.

• Qual foi o canto mais inusitado de onde tirou inspiração?
Uma igreja de praia que ficou 45 anos soterrada por uma duna móvel.

• Quando a inspiração não vem…
Não depende de inspiração, trabalho de qualquer maneira. Com inspiração fica bem melhor, mas a falta não me impede.

• Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Guimarães Rosa, para falar sobre cartomantes e coisas do além.

• O que é um bom leitor?
O que pensa sobre o que lê.

• O que te dá medo?
Baratas voadoras. Elas não têm consideração.

• O que te faz feliz?
Minhas filhas. Escrever. Ler um livro bom. Terminar de escrever um livro e achar bom. Guacamole. Amêndoas.

• Qual dúvida ou certeza guiam seu trabalho?
Certeza de nada. Sempre muitas perguntas.

• Qual a sua maior preocupação ao escrever?
Escrever a história que só eu posso contar.

• A literatura tem alguma obrigação?
Não.

• Qual o limite da ficção?
O respeito ao outro.

• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
À casa do Raduan Nassar, mas não sei se ele abriria a porta.

• O que você espera da eternidade?
A possibilidade de mudar de território sem precisar de um avião.

Profissão de verdade
Socorro Acioli
Dummar
196 págs.
Rascunho

Rascunho foi fundado em 8 de abril de 2000. Nacionalmente reconhecido pela qualidade de seu conteúdo, é distribuído em edições mensais para todo o Brasil e exterior. Publica ensaios, resenhas, entrevistas, textos de ficção (contos, poemas, crônicas e trechos de romances), ilustrações e HQs.

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