Poemas de Roberto Fernández Retamar

Leia os poemas traduzidos "Agradecendo o presente de uma pluma de faisão", "O outro" e "Está"
Roberto Fernández Retamar, poeta cubano
31/12/2019

Tradução: Adriana Lisboa

Agradeciendo el regalo de una pluma de faisán

Con esta hermosa pluma tornasolada puedo
Escribir las palabras en que García Lorca
Dijo
Herido de amor huido.
Dijo que en tus ojos
Había un constante desfile de pájaros,
Un temblor divino como de agua clara
Sorprendida siempre sobre el arrayán.

Escribir las palabras en que Góngora dijo
A batallas de amor campos de pluma.

Escribir las palabras en que Antonio Machado
Dijo
Hoy es siempre todavía.

Agradecendo o presente de uma pluma de faisão

Com esta bela pluma lustrosa posso
Escrever as palavras em que García Lorca
Disse
Ferido de amor fugido.
Disse que em teus olhos
Havia um constante desfile de pássaros,
Um tremor divino como de água clara
Surpreendida sempre sobre o mirtilo.

Escrever as palavras em que Góngora disse
A batalhas de amor, campos de pluma.

Escrever as palavras em que Antonio Machado
Disse
Hoje é sempre ainda.

……….

El otro

Nosotros, los sobrevivientes,
¿A quiénes debemos la sobrevida?
¿Quién se murió por mí en la ergástula,
Quién recibió la bala mía,
La para mí, en su corazón?
¿Sobre qué muerto estoy yo vivo,
Sus huesos quedando en los míos,
Los ojos que le arrancaron, viendo
Por la mirada de mi cara,
Y la mano que no es su mano,
Que no es ya tampoco la mía,
Escribiendo palabras rotas
Donde él no está, en la sobrevida?

O outro

Nós, os sobreviventes,
A quem devemos a sobrevida?
Quem morreu por mim no cárcere,
Quem recebeu minha bala,
A que era para mim, em seu coração?
Sobre que morto estou vivo,
Seus ossos perdurando nos meus,
Os olhos que lhe arrancaram vendo
Pelo olhar da minha cara,
E a mão que não é sua mão,
Que já tampouco é a minha,
Escrevendo palavras rotas
Onde ele não está, na sobrevida?

……….

Está

Ella está echada en la penumbra humedeciendo la
madrugada inicial.
Hay un jardín en ella y él está deslumbrado en ese jardín.
Florece entera para él, se estremecen, callan con el mismo
rumor.
La noche va a ser cortada por un viaje como por una
espada.
Intercambian libros, papeles, promesas.
Ninguno de los dos sabe aún lo que se han prometido.
Se visten, se besan, se separan.
Ella sale a la oscuridad, acaso al olvido.
Cuando él regresa al cuarto, la encuentra echada en la
penumbra húmeda.
Nunca ha partido, nunca partirá.

Está

Ela está derramada na penumbra umedecendo a
madrugada inicial.
Há nela um jardim e ele está deslumbrado nesse jardim.
Floresce inteira para ele, se estremecem e se calam com o mesmo
rumor.
A noite vai ser cortada por uma viagem como por uma
espada.
Trocam livros, papéis, promessas.
Nenhum dos dois sabe ainda o que se prometeram.
Se vestem, se beijam, se separam.
Ela sai para a escuridão, acaso para o esquecimento.
Quando ele regressa ao quarto, encontra-a derramada na
penumbra úmida.
Nunca partiu, nunca partirá.

Roberto Fernández Retamar
(Havana, 1930-2019) foi um dos mais importantes intelectuais latinoamericanos. Poeta, ensaísta e professor universitário, ocupou a presidência da Casa de las Américas, em Cuba, desde 1986 até sua morte em julho passado.
Adriana Lisboa

Nasceu em 1970 no Rio de Janeiro (RJ) e atualmente vive nos Estados Unidos. Entre romances, contos, livros infantis e infanto-juvenis, possui mais de dez títulos publicados. Possui três títulos em poesia: Parte da paisagem (2014), Pequena música (2018 — Menção honrosa no prêmio Casa de las Américas) e Deriva (2019).

Rascunho