Poemas de Bruno Brum

Leia os poemas "Guia prático dos sofredores anônimos, "Jovem", "Minha amargura", "Sem ninguém por perto" e "É preciso"
O poeta Bruno Brum
31/12/2016

Guia prático dos sofredores anônimos

Hoje nós vamos sofrer.
Só por hoje vamos sofrer.
Sofrer tudo de uma vez.
Tudo o que há para sofrer.
Vamos sofrer calados.
Vamos sofrer cantando.
Tudo de uma só vez.
Do jeito que der para sofrer.
Sem ressalvas.
Sem reservas.
Sem esquemas.
Sofrer apenas.
Sofrer de olhos abertos.
Sofrer sem sentir pena.
Toda dor será bem-vinda.
Abriremos as feridas.
Toda chaga, toda mágoa.
Só por hoje vamos sofrer.
Sem saber onde.
Sem saber como.
Sem nem querer saber.
Sofrer de braços abertos.
Até não mais poder.
Sofrer sem dizer nada.
Tudo o que há para sofrer.

…..

Jovem

Jovem deixa óculos em museu
e visitantes pensam que é obra de arte.
Jovem deixa obra de arte em museu
e visitantes pensam que perderam os óculos.
Jovem recolhe óculos de museu
e visitantes pensam qualquer outra coisa.
Jovem, colabore.

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Minha amargura

Minha amargura é antiga, veio ao mundo bem antes de mim.
Minha amargura esteve em muitos lugares e conheceu muitas pessoas.
Minha amargura é alegre e gosta de jogar conversa fora.
Minha amargura é descolada e faz sucesso na internet.
Minha amargura por anos andou sozinha em busca de um grande amor.
Minha amargura às vezes enche a cara pensando em comer alguém.
Minha amargura de madrugada manda mensagens para números desconhecidos.
Minha amargura aborda estranhos na rua e conta sempre a mesma história.
Minha amargura me afasta dos meus amigos e me enche de culpa.
Minha amargura fala com as paredes e não me deixa em paz.
Minha amargura sabe que um dia isso acaba.
Minha amargura sabe que enquanto esse dia não chega tudo tende a piorar.
Minha amargura diz com frequência que devo manter a calma.
Minha amargura insiste que tenho me aborrecido demais.
Minha amargura me preocupa toda vez que some por um tempo.
Minha amargura nunca chegou atrasada a um encontro.
Minha amargura sabe o que quer.
Minha amargura quer me matar.
Minha amargura quer me matar, mas, por pirraça, não mata.
Vivo dizendo para minha amargura:
Enfia logo essa faca no meu bucho
e faz um torresmo bem gostoso pra gente comer.

…..

Sem ninguém por perto
Admiro as plantas que vivem neste apartamento.
Sem água fresca, cortinas fechadas, pouca conversa.
Respeito estas plantas: pequenas, robustas, teimosas.
Sem ninguém por perto quando o sol castiga.
Sem quem abra a janela para entrar a brisa.
Sobre a mesa da sala, no banheiro, na varanda.
Em silêncio, orgulhosas.
Não morreriam a troco de nada.

…..

É preciso

É preciso muita garra e determinação para alcançar o topo.
É preciso muita garra e determinação para alcançar o.
É preciso muita garra e determinação para alcançar.
É preciso muita garra e determinação para.
Enfim, vocês entenderam.

Bruno Brum

Nasceu em Belo Horizonte (MG), em janeiro de 1981. É poeta e designer gráfico. Publicou os livros Mínima ideia (2004), Cada (2007), Mastodontes na sala de espera (2011), vencedor do Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura 2010, na categoria poesia, e 20 sucessos (2016, em parceria com Fabiano Calixto). É o idealizador e um dos curadores, ao lado de Ana Elisa Ribeiro, da Coleção Leve um livro, que a cada mês distribui 5 mil livros de poesia nas ruas da capital mineira.

Rascunho