Luiz Schwarcz, inspiração e reflexão

Editor e escritor esteve recentemente no centro do "Roda Vida" e tratou de maneira ambígua a importante implantação da Lei Cortez
Luiz Schwarcz, editor, escritor e fundador da Companhia das Letras
31/05/2025

O programa Roda Viva da TV Cultura é um marco na história dos programas televisivos. Os convidados se sentam no centro de uma grande arena na qual uma apresentadora, hoje a jornalista Vera Magalhães — antes dela, muitos grandes nomes já foram os apresentadores, entre eles, Paulo Markun e Leão Serva —medeia e coordena outros jornalistas ou intelectuais convidados a participar dessa grande entrevista. Pelo programa, iniciado em setembro de 1986, já passaram grandes figuras do Brasil e do exterior, deixando ali um registro sobre sua vida, carreira, ideias e ideais.

Foi neste programa que o editor e escritor Luiz Schwarcz foi o centro da roda. Quando soube que ele seria o entrevistado, me programei para assistir e, chegando próximo ao horário, pedi à minha esposa e ao meu filho para assistirem à novela das nove depois. Eles têm uma baita boa vontade comigo, toparam já saindo da sala.

O Luiz é a minha referência como editor. Sua trajetória desde o início da Companhia das Letras em 1986 até os dias atuais — com um mundo transformado pelas redes, pela tecnologia e por consequência pelos hábitos do consumidor — me inspira, me serve de referência, me mostrando que é possível reunir ousadia e austeridade.

O gancho que serviu de pauta para sua ida ao Roda Viva é o recém-lançado livro de memórias O primeiro leitor: Ensaio de memória. Na obra, conhecemos as histórias dele e de grandes amigos que o formaram no ofício, sua formação e suas afinidades com figuras que ajudam a contar sua própria vida por meio de narrar a vida dos outros, sejam eles seus professores, autores ou mesmo concorrentes. Para mim, que me vejo e sou uma mistura de livreiro com editor, a leitura me é muito prazerosa e paro a cada página para pensar sobre as revelações contadas por Schwarcz — a admiração se mantém a cada linha.

Voltando ao programa, fico atento às perguntas feitas por ótimas figuras, tanto do meio editorial — como a Ana Lima Cecílio, editora e curadora da Flip —, quanto do jornalismo, exemplo do Marco Augusto Gonçalves, da Folha de S. Paulo, que se dirigem ao Luiz com repertório adquirido, com bons conteúdos e uma quase intimidade proveniente de todos viverem neste mundo, o mundo das publicações, do mercado editorial.

O meu ponto de reflexão se deu quando outro entrevistador, o professor da Unicamp Luiz Maurício Azevedo, trouxe um assunto ao qual me conecto de maneira atenta, é a minha obsessão, a nossa causa: a Lei Cortez. Schwarcz foi questionado acerca de sua opinião sobre a lei. Aí, mudo a forma de ver o programa, saio do campo da leveza para a atenção ligada ao nosso futuro, à nossa sobrevivência, e claro, fico mais exigente com o que pode estar por vir. E nesse momento Schwarcz começou desenvolvendo muito bem a resposta, explicou um pouco sobre a lei, sobre a regulamentação de uns 5% dos livros lançados no país que representam as novidades do mercado, que em um ano a partir da chegada do livro, teria um desconto sobre o valor de capa igualitário, regulamentando e saneando o mercado editorial, protegendo suas livrarias e a diversidade de títulos, freando a agressividade da gigante Amazon, assim como já se faz por meio de lei em mais de trinta países.

Schwarcz comenta concordando que as livrarias precisam de proteção e, na sequência do seu raciocínio, deixa o telespectador com um sentimento ambíguo, porque ele segue dizendo que a situação é complexa e que o livro, depois de aplicada a lei, pode subir de preço. Acho que aí ele tem uma perda de lucidez, porque o livro não terá aumento, terá uma regulamentação sobre o abuso das lojas virtuais, e que o fenômeno seguinte à implementação da lei foi a redução dos preços dos livros em mais de 15% nos países que adotaram a defesa.

Dali pra frente me concentrei para abandonar a contrariedade sobre o dito, voltei a acompanhar com respeito e admiração as falas do maior editor brasileiro em atuação nos dias que correm.

Penso que, sem algumas pessoas, o Brasil seria um país infinitamente pior, penso que sem um Danilo Santos de Miranda ou sem um Luiz Schwarcz, seríamos sem dúvida menos letrados, menos cultos, até menos justos.

Mas quando alguns assuntos se tornam a pauta, perco os meios-tons, espero demais para que as pessoas façam o que desejo que elas façam e, nesse assunto, sinto que o Schwarcz deixou a desejar. Talvez por ter crescido tanto e por ter tantos negócios com o mundo das gigantes digitais, talvez por estar numa situação privilegiada (com todo o mérito), acabe por ficar distante das urgências — o que entendo ao fazer um exercício imaginativo de me colocar em seu lugar. O tema da lei Cortez assombra a nós, os livreiros, há dez anos, esperando que ela seja aplicada também no Brasil.

Escrever essas linhas me fez bem, todo o meu respeito e admiração ao Luiz Schwarcz.

José Luiz Tahan

É livreiro, editor e idealizador do festival Tarrafa Literária. Autor da antologia de crônicas Um intrépido livreiro nos trópicos (Vento Leste).

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