O mestre Alfredo Bosi

As lembranças de momentos ao lado de um dos intelectuais mais brilhantes do país, que também soube como poucos cultivar as relações humanas
Alfredo Bosi, autor de “Literatura e resistência”
01/10/2021

Antonio Candido e Alfredo Bosi foram exemplos de intelectuais estupendos, os mais importantes que a USP já teve no campo das Letras — e, é oportuno dizer, foram pessoas muito simples, educadíssimas, de ótimo trato. Em São Paulo, outra pessoa de excelente trato e pesquisadora extraordinária é a professora Adélia Bezerra de Meneses, que colaborou, sempre muito educada, atenciosíssima, com os livros que organizei sobre Chico Buarque. Cito ainda Cleusa Rios Pinheiro Passos, Luiz Tatit e Suzi Frankl Sperber. Liguei uma vez para Antonio Candido, quando eu estava organizando o livro Chico Buarque do Brasil, e lhe pedi um depoimento sobre o compositor e romancista para constar do livro. Ele foi de uma educação ímpar. Passados alguns dias, pulou embaixo de minha porta uma correspondência que ele me enviou. Dela constava um depoimento marcante, na verdade uma síntese precisa do que significa para o Brasil o artista Chico Buarque — depoimento que incluí da parte inicial do livro que organizei em 2004. Sou sempre muito agradecido ao professor Antonio Candido, cujos textos críticos utilizo permanentemente em minhas aulas. Quando fazia o doutorado na Unicamp e morava em São Paulo, fiz como ouvinte uma disciplina de Alfredo Bosi na USP. Que disciplina, que aulas, que intelectual era Alfredo Bosi! Quem assistia aula nessa disciplina, se não me engano, era o romancista amazonense Milton Hatoum. No final de uma das aulas, conversei com Alfredo Bosi, falei do valor da antologia que ele organizara para a Cultrix, O conto brasileiro contemporâneo, mencionei um dos autores da antologia, o contista cearense Moreira Campos, que tinha sido meu professor na Universidade Federal do Ceará. Bosi fez elogios a Moreira Campos — e sempre muito atento, cordial, empenhado na nossa conversa. Nesse dia ele autografou para mim o seu livro O enigma do olhar, com brilhantes ensaios sobre Machado de Assis. Livro que utilizo em minhas aulas de Literatura Brasileira na UFPB. Como utilizo também o seu primoroso Dialética da colonização, quando dou aulas sobre o período inicial de nossa literatura. Já utilizei em aulas de Teoria da Literatura (disciplina para a qual fui concursado na UFPB) o seu fundamental O ser e o tempo da poesia. De Bosi ficou para mim a imagem não só de um imenso intelectual, de membro da Academia Brasileira de Letras, mas também de um ser humano valoroso, cordial, atento às relações humanas, conforme eu mesmo pude perceber e ler, após a sua morte, em vários depoimentos de ex-alunos e de colegas seus. Um exemplo de homem que cultivou, como Antonio Candido o fez, as relações humanas. E que tornou isso fator central do seu humanismo. Todos os parabéns ao mestre Bosi!

Rinaldo de Fernandes

É escritor e professor de literatura da Universidade Federal da Paraíba. Autor de O perfume de Roberta, entre outros.

Rascunho