Um novo recorte da literatura brasileira contemporânea aparece na antologia Geração 2010: o sertĂŁo Ă© o mundo, que a editora ReformatĂłrio publica ainda em julho. SĂŁo 25 autores escolhidos pelo escritor e pesquisador Fred Di Giacomo, em sua maioria “intelectuais negros, indĂgenas e perifĂ©ricos”, que nĂŁo se identificam com “a literatura nĂłrdica” que se fazia no Brasil atĂ© recentemente, segundo o antologista.
SĂŁo autores como Micheliny Verunschk, MaĂlson Furtado e Itamar Vieira Junior, que emergiram no cenário literário nacional vindos de lugares fora do eixo Sul-Sudeste. AlĂ©m de serem publicados por grandes editoras, esses autores ganharam algumas das principais premiações literárias dos Ăşltimos anos. O livro traz texto de orelha de Marçal Aquino, escritor acostumado a figurar em antologias.
Esse “ponto de virada” da literatura brasileira, aconteceu por razões sociais, polĂticas e tecnolĂłgicas, conforme explicam nesta entrevista Di Giacomo e Marcelo Nocelli, editor da obra. AlĂ©m disso, o surgimento de um grande nĂşmero de pequenas editoras no paĂs tambĂ©m impulsionou o aparecimento de novas vozes no cenário literário.
“Houve uma mudança social e polĂtica no Brasil entre 2003 e 2016, que veio da pressĂŁo da sociedade e dos movimentos sociais e identitários organizados e gerou mudanças como estabilidade econĂ´mica, criação de universidades nos interiores, polĂticas de cotas e de inclusĂŁo social”, diz Di Giacomo, que acredita que hoje a literatura brasileira vive seu melhor momento dos Ăşltimos 50 anos.
• Antologias de geração costumam ser polêmicas. Qual a motivação para reunir esses autores neste livro?
Fred Di Giacomo: Há uma mudança acontecendo no Brasil: polĂtica, econĂ´mica e racial, que incomoda nossa elite branca, tacanha e mesquinha. Essa mudança — sincronizada com os estudos decoloniais, o pĂłs-humano, o perspectivismo amerĂndio, na academia, e as lutas identitárias, nas ruas — se reflete em nossa literatura, em nossas artes, criando um momento muito interessante para se estar vivo. Veja, quando eu era adolescente, em um bairro da periferia no interior do paĂs, eu nĂŁo me identificava com a literatura “contemporânea” que caĂa nas minhas mĂŁos. Meus vizinhos bĂłias-frias e carroceiros tinham mais a ver com o que eu lia em Graciliano Ramos ou Jorge Amado do que com o que queriam vender como o “Brasil de 1990/2000”. Quando migrei para a capital paulista, em 2006, “sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”, nĂŁo conhecia ninguĂ©m da cena literária paulistana, parecia tudo um clube muito fechado e elitista de velhos amigos dos colĂ©gios construtivistas da zona oeste paulistana. Se para alguns, os banqueiros eram os que lhes financiavam as aventuras artĂsticas, para mim eram os que haviam tomado a casa dos meus pais. No entanto, já na dĂ©cada de 2010, as notĂcias das premiações de Micheliny Verunschk, MaĂlson Furtado e Itamar Vieira Junior, me fizeram ter a impressĂŁo de que algo mudava em nossa literatura. De que essa solidĂŁo estĂ©tica podia estar chegando ao fim. Fui atrás de suas obras e me identifiquei muito com a temática e a linguagem. O Brasil que eles retratavam era o da minha infância, independentemente de serem autores do Nordeste e eu ter me criado ali onde o Sudeste abraça o Centro-Oeste — com todo agronegĂłcio, mĂşsica sertaneja e cultura caipira que isso inclui. Pouco depois, tive o privilĂ©gio de participar da Printemps LittĂ©raire, na Sorbonne, e da Feira do Livro de Frankfurt, e fiz contato com outros autores que pareciam rezar a mesma cartilha: Raimundo Neto, Krishna Monteiro, Djamila Ribeiro, Waleska Barbosa, entre outros. Escrevi alguns artigos para a revista Cult sobre essas impressões, que me levaram a me aprofundar no tema. Isto acabou virando um projeto de doutorado e uma coluna semanal no portal UOL. Convencido de que algo, de fato, acontecia em nossa literatura, propus a antologia pro Marcelo Nocelli que gostou da ideia. NĂŁo tive a intenção de demarcar um ranking, um cânone, uma seleção de “melhores”, mas de fazer uma fotografia de um momento histĂłrico importante.
Marcelo Nocelli: Quando o Fred propôs a ideia, lá em 2018, quando começamos a convidar os autores e organizar os textos, eu gostei muito. Sempre fui leitor de antologias, porque, para mim, é uma forma de conhecer autores, vários autores num mesmo livro, e dali buscar os que mais me agradam para mergulhar na obra. Tratando-se de literatura brasileira contemporânea então, melhor ainda. Quantos leitores brasileiros comprariam e leriam um livro inteiro de cada um desses autores? Até por isso, sugeri ao Fred que além dos “novos clássicos” de hoje, ou melhor, autores que realmente foram consagrados nesta década, como Maria Valéria Rezende, Itamar Vieira Jr e Ailton Krenak, garimpássemos também jovens talentos que germinam nos interiores do Brasil, como Maya Falks, Victor Guilherme Feitosa, Monique Malcher, entre outros.
• A antologia parte do princĂpio de que houve um “ponto de virada” na literatura brasileira, com autores que em outros tempos poderiam ser considerados “perifĂ©ricos” ganhando destaque. Isso aconteceu a partir de 2010?
Fred Di Giacomo: Olha eu diria que “pontos de virada” sĂŁo mais polĂŞmicos que antologias (risos). Mas como diz nosso mestre GuimarĂŁes Rosa: “o que a vida quer da gente Ă© coragem”, entĂŁo bora cravar essa virada. Houve uma mudança social e polĂtica no Brasil entre 2003 e 2016, que veio da pressĂŁo da sociedade e dos movimentos sociais e identitários organizados e gerou mudanças como estabilidade econĂ´mica, criação de universidades nos interiores, polĂticas de cotas e de inclusĂŁo social. Isso germinou, ou nos apresentou, uma classe de intelectuais negros, indĂgenas e perifĂ©ricos, mas um pĂşblico letrado que nĂŁo se identificava com a literatura nĂłrdica que se fazia no Brasil atĂ© entĂŁo. A produção de pessoas do interior, das matas e dos sertões sempre existiu. No entanto, o aguçamento do neoliberalismo, com a ditadura militar, a partir da dĂ©cada de 70, provocou um retrocesso cultural em nosso paĂs, uma miopia que nos fez esquecer quĂŁo mĂşltiplos Ă©ramos. Mas o “campo literário” passou a reconhecer esse Brasil esquecido depois de todas essas mudanças. É difĂcil para a branquitude sudestina largar o espelho e parar de se admirar. Quando o Jabuti premiou o MaĂlson e, na sequĂŞncia, Itamar, Jarid Arraes, Cida Pedrosa e grande elenco passaram a encabeçar as principais premiações, algo mudou em nossa literatura. Grandes editoras como a Todavia e a Companhia das Letras estĂŁo publicando agora muitos autores que as “pequenas editoras” lançaram na Ăşltima dĂ©cada. É impossĂvel pensar essa geração sem pensar editoras como a CEPE, Patuá, ReformatĂłrio, MalĂŞ, Mondrongo, Penalux, Moinhos, Caos e Letras, etc.Isso nĂŁo quer dizer que nĂŁo houvesse exceções nas dĂ©cadas anteriores, vide a maravilha de Um defeito de cor, da Ana Maria Gonçalves, mineira do interior que publicou seu romance na dĂ©cada de 2000, mas que sĂł passou a ser devidamente considerado uma obra-prima na Ăşltima dĂ©cada. Ana Maria Ă© uma predecessora espiritual desta geração. A luta indĂgena Ă© outro ponto de virada. Quase nĂŁo se falava de autores indĂgenas no começo da dĂ©cada de 2010 e os fenĂ´menos A queda do cĂ©u e Ailton Krenak provaram a demanda reprimida que havia por essas vozes.
Marcelo Nocelli: Eu diria que alĂ©m das mudanças sociais e econĂ´micas, a internet ajudou muito neste “ponto de virada”. No começo dos anos 2000 pouca gente tinha acesso Ă internet, sobretudo para produzir e publicar conteĂşdo. Surgiram entĂŁo os blogs, onde muitos escritores publicavam seus textos, sem a necessidade de buscar uma editora pra isso. Mas os leitores ainda eram poucos e vocĂŞ precisava ir atrás desses conteĂşdos digitais. Em 2004 surgiram as redes sociais em larga escala, o Orkut, e foram surgindo outras. Dali em diante esses conteĂşdos chegavam atĂ© nĂłs, sem que tivĂ©ssemos que procurar. Os famosos algoritmos, usados atĂ© hoje para o bem e para o mal, tratavam de nos apresentar “coisas” de nosso interesse. Mas de 2010 pra cá, todo mundo passou a usar a internet, atĂ© as tribos indĂgenas por exemplo, se conectaram Ă s redes. Na internet, ninguĂ©m mais está “à margem”. Isso possibilitou que autores que ainda nem tinham livros publicados, pudessem ser lidos e se tornassem mais conhecidos do que muita gente que já tinha trĂŞs ou quatro livros lançados. Na internet nĂŁo há divisĂŁo de centro e periferia, todo mundo tá ali, junto e misturado e isso representou uma virada importante, junto com o surgimento das pequenas editoras, que proliferaram de 2010 pra cá, e lançaram ao mundo os nomes de boa parte dos autores que estĂŁo nesta antologia, por exemplo.
• Por que esses autores começaram a ser percebidos?
Fred Di Giacomo: Essa pergunta vale o doutorado (risos). Houve uma mudança polĂtica no Brasil, nĂ©? Sempre existiram autoras e autores como Conceição Evaristo, mas que nĂŁo furavam a bolha da nossa elite intelectual. Entre as dĂ©cadas de 80 e 2000, parecia que sĂł havia literatura nos grandes centros: de um lado a autoficção dos ricos, do outro a literatura marginal das periferias e favelas. Ambas literaturas com gente muito boa, mas um recorte pequeno de um paĂs gigante.
A partir de 2003, o Brasil passou por muitas mudanças, inclusive de autoestima e autopercepção. Questões identitárias, questões dos indĂgenas, questões dos quilombolas, questões dos interiores passaram a ser discutidas. A luz chegou para lugares onde nĂŁo havia. Acho que as editoras e o “campo literário” atĂ© demoraram para acompanhar essas mudanças todas. A geração de pequenas editoras fez muito por essa percepção. Em entrevista para minha coluna, Itamar Viera Junior defende que essa mudança veio mais da pressĂŁo do pĂşblico. Diz ele: “Os Ăşltimos governos vieram num processo muito importante de inclusĂŁo da sociedade. Abriram as polĂticas de cotas, permitiram o ingresso de muitas pessoas Ă universidade. Pessoas oriundas de escolas pĂşblicas, pessoas dos segmentos sociais mais vulneráveis da nossa sociedade como os indĂgenas, os quilombolas e as populações negras em geral. Tudo isso reverbera nĂŁo sĂł nos escritores, mas, tambĂ©m, nos leitores que vĂŁo buscar referĂŞncias que lhes digam respeito. Isso Ă© muito forte.”
Marcelo Nocelli: Mais uma vez, acho importante citar essa possibilidade que a internet nos deu do contato direto entre autor e leitor. Antes um escritor lançava um livro e fora do seu cĂrculo de convĂvio, ele nĂŁo sabia quem estava lendo sua obra, hoje ele sabe, vĂŞ comentários pĂşblicos sobre seus livros, recebe mensagens dos leitores. A escritora paulistana Aline Bei, por exemplo, vendeu mais de 10 mil exemplares de forma direta, pelas redes sociais e no contato com seus leitores em eventos literários. O nĂşmero de feiras e festas literárias aumentou consideravelmente nos Ăşltimos anos, os presenciais e os virtuais, que alcançam ainda um nĂşmero maior de pessoas porque ficam disponĂveis para quem quiser ver, quando e onde quiser. Há tambĂ©m as premiações literárias, que sempre dĂŁo algum destaque aos autores, nĂŁo sĂł aos que conquistam tais prĂŞmios, mas tambĂ©m aos que figuram nas listas de finalistas e semifinalistas. AlĂ©m disso, hoje, muitos autores brasileiros contemporâneos estĂŁo sendo estudados nas universidades e escolas, o que nĂŁo acontecia antes. Há clubes de leitura e de assinaturas voltados exclusivamente para a literatura brasileira contemporânea, tudo isso, somado Ă s mudanças que o Fred citou, tem feito com que estes autores sejam percebidos.
• O tĂtulo do livro faz referĂŞncia ao Nordeste brasileiro. Mas há escritores do Sul e Sudeste no livro. Como foi feita a escolha dos autores?
Fred Di Giacomo: Na verdade, o tĂtulo nĂŁo faz referĂŞncia ao Nordeste brasileiro. A frase Ă© de GuimarĂŁes Rosa, mineiro de Cordisburgo, que escrevia sobre o sertĂŁo das Gerais. Quando meus avĂłs mudaram para Penápolis (noroeste paulista, quase Mato Grosso do Sul), fugindo de dĂvidas contraĂdas em JaĂş, minha avĂł chorava todo dia dizendo que aquilo era “a boca de sertĂŁo”. Nas pesquisas para o meu primeiro romance, Desamparo, todo o interior de SĂŁo Paulo que os brancos ainda nĂŁo haviam invadido era chamado de sertĂŁo. E Ă© assim que está nos dicionários: “1. regiĂŁo agreste, afastada dos nĂşcleos urbanos e das terras cultivadas. 2. terreno coberto de mato, afastado do litoral. 3. a terra e a povoação do interior; o interior do paĂs.” Já, outra definição de GuimarĂŁes, Ă©: “SertĂŁo Ă© dentro da gente”. Sendo assim, o recorte foi de autores que despontaram na dĂ©cada de 2010 e que nĂŁo vinham dos grandes centros urbanos que dominavam a literatura brasileira atĂ© entĂŁo, as capitais (SĂŁo Paulo, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte). TambĂ©m prezamos, Ă© claro, pela qualidade literária, mas sem ambição de uma seleção dos “melhores” ou do “cânone”. É um recorte de tempo e espaço de bons escritores vivos que tĂŞm algumas semelhanças polĂticas e estĂ©ticas.
• O que “une” esses autores? Há pontos de convergência — estética e tematicamente — entre eles?
Fred Di Giacomo: Olha, essa Ă© uma pergunta que pretendo responder decentemente no final do meu doutorado em literatura, onde analiso parte desses autores (risos). O principal recorte, como respondi anteriormente, Ă© o “tempo” e o “lugar”. É difĂcil colocar 25 autores e autoras no mesmo balaio estĂ©tico, mas existe, sim, uma proximidade em grande parte da obra deles. Primeiramente: nĂŁo sĂŁo autores que focam na autoficção urbana, o que já os diferencia frontalmente “da geração anterior”. Em uma parte considerável desses autores, suas histĂłrias se passam no interior do paĂs, sĂŁo protagonizadas por pessoas que nĂŁo pertencem Ă elite sudestina — com uma diferença de lugar de fala em relação aos regionalistas de 30: aqui a maior parte dos autores tambĂ©m vem da classe trabalhadora ou de lugares nĂŁo-privilegiados. Dos autores que tenho estudado no doutorado hoje (Dorrico, Itamar, Verunschk, Neto, Monteiro, Rezende, Ribeiro) tambĂ©m posso dizer que se destaca uma dimensĂŁo Ă©pica em sua prosa, uso de linguagem poĂ©tica, presença da religiosidade “nĂŁo-cristã”, elementos fantásticos e jogos com o perspectivismo — muita dessa literatura Ă© protagonizada por animais e espĂritos, vide os Ăşltimos terços de O som do rugido da onça e Torto arado.
Marcelo Nocelli: AlĂ©m do tempo, e do espaço, creio que há sim um equilĂbrio entre os textos, mas que expressam com nitidez as caracterĂsticas de cada autor quanto Ă sua maneira de escrever e de enxergar o mundo. É importante observar tambĂ©m que a literatura brasileira evoluiu muito nesta Ăşltima dĂ©cada, tanto em temáticas quanto em linguagem e estruturas. Me parece que nestes Ăşltimos anos a literatura brasileira rompeu barreiras importantes, se renovou, se ampliou e, principalmente, se diversificou, graças a uma mistura e renovação de “atores”. E tudo isso está presente neste livro, de formas diferentes, por talentos diferentes, em um momento social que acaba por integrar a estĂ©tica.
• Alguns crĂticos acham que a qualidade literária tem sido preterida por questões “politicamente corretas”, como gĂŞnero e raça. Como veem esse debate?
Fred Di Giacomo: Eu acredito, sim, que a qualidade literária foi preterida por muitas dĂ©cadas pela questĂŁo de territĂłrio e raça: sĂł brancos ricos “amigos dos amigos” publicavam no Brasil e isso empobreceu muito nossa literatura. Muitos dos donos de editoras, festivais, bancos, jornais e revistas literárias vĂŞm inclusive das mesmas famĂlias. Isso lá Ă© critĂ©rio de qualidade literária Vamos jogar com as regras da crĂtica que se considera “cientĂtica”: se vocĂŞ for se apegar ao cânone nacional, ao que a academia defende, quem sĂŁo os “grandes nomes”? Machado, Lima Barreto, os regionalistas de 30, Raduan… Itamar Vieira Junior tem muito mais a ver com essa literatura (atualizada esteticamente para o sĂ©culo 21, claro) do que o que se publicou no Brasil nos Ăşltimos anos por aqui, com autores pouco vendidos, pouco traduzidos no exterior e que despertaram pouco interesse fora de nosso cĂrculo Ăntimo. Sejamos honestos, estamos na melhor fase da nossa literatura nos Ăşltimos 50 anos e quem nĂŁo concorda nĂŁo lĂŞ os vivos. É claro que, como em todas as dĂ©cadas, muita coisa sem qualidade está sendo publicada, mas tem muita coisa que “vai ficar”. Agora, acho muito importante lembrar que “raça” e “territĂłrio” sĂł viram marcações quando se referem Ă raça negra e Ă indĂgena ou Ă s periferias, aldeias e sertões. Toda literatura Ă© regional. As antologias “nĂŁo politicamente corretas”, em geral, tĂŞm recorte de raça e territĂłrio: a raça branca e a zona sul do Rio e a zona oeste de SĂŁo Paulo. Por que Jarid Arraes Ă© regional e Julie Dorrico Ă© Ă©tnica, mas o autor branco e rico que domina o cenário literário nas Ăşltimas dĂ©cadas nĂŁo o Ă©? Sou a favor da meritocracia quando Ă© aplicada para nĂłs, brancos. É preciso acabar com as panelinhas no combalido cenário cultural nacional!
Marcelo Nocelli: Talvez isso possa mesmo ter ocorrido no começo das mudanças polĂticas e sociais que o Fred citou aqui mais de uma vez. Nessa tentativa de “revisionismo histĂłrico” do nosso paĂs, com a polĂtica de cotas e a inclusĂŁo da sociedade, tĂŁo necessárias na busca por um equilĂbrio diverso. Mas como tudo na vida, e em todos os campos, o que tem força e qualidade se destaca e ocupa seu lugar, fica. Como disse a professora Regina Dalcastagnè: “NĂłs nĂŁo separamos o joio do trigo: nĂłs determinamos o que Ă© joio e o que Ă© trigo”. E cada leitor pode e deve fazer isso, assim como os crĂticos. PorĂ©m, hoje, como disse o Fred na apresentação do livro, “seria tecnicamente impossĂvel selecionar 25 bons autores para representar essa geração 2010 sem incluir na lista um grande nĂşmero de mulheres, negros, indĂgenas e autores LGBTQIA+”, e justamente pela qualidade de seus escritos, e nĂŁo por qualquer outra razĂŁo politicamente correta.