Todo o resto é muito cedo, terceiro livro de Luiza Mussnich, lançado em 2024, traz as marcas do tempo de incertezas que a pandemia legou ao mundo. Em seus “poemas-listas”, a autora carioca também dialoga com autores caros à sua escrita, como Chico Alvim e Ana Cristina Cesar.
“Uso a escrita como uma forma de entendimento, de investigação”, diz a autora. “Escrever é enaltecer o ‘não saber’, tatear os ‘ses’, ‘talvezes’ e ‘quases’ do mundo.”
Ela também cita algumas de suas escritoras favoritas, como Clarice Lispector e a norte-americana, vencedora do Pulitzer, Anne Sexton. Além de indicar nomes ainda pouco conhecidos do cenário nacional, como a poeta Natasha Félix e o contista Ronald Lincoln.
Mestre em Literatura pela PUC-Rio, Mussnich é autora ainda de outros dois livros de poesia: Tudo coisa da nossa cabeça (7Letras, 2021) e Lágrimas não caem no espaço (7Letras, 2018).
• Quando se deu conta de que queria ser escritora?
Desde que ouvi pela primeira vez essa pergunta, o “ser escritora” sempre foi o meu “ser astronauta”. Gostava de conjecturar outras possibilidades que não somente a vida que se apresentava para mim. Entendi que a escrita poderia ser uma forma de viver e criar um outro mundo.
• Quais são suas manias e obsessões literárias?
Anotar aulas, palestras e coisas que me chamam atenção em cadernos; sublinhar e escrever nos livros que estou lendo. Acho que, no fim, é uma obsessão que tenho pelo registro, pelo guardar, uma preocupação imensa em não esquecer.
• Que leitura é imprescindível no seu dia a dia?
O momento de leitura de livros ilustrados com meus filhos deitados na cama comigo.
• Se pudesse recomendar um livro ao presidente Lula, qual seria?
Escute as feras, da Nastassja Martin.
• Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
Ter a mente limpa. Estar aberta aos rumos que a escrita tomar. Controlar a ansiedade.
• Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Atualmente, com dois filhos pequenos e que demandam muita atenção: ter algum tempo. A leitura é sempre por brechas e frestas, com interrupções. Mas a gente aprende a abraçar essa nova dinâmica.
• O que considera um dia de trabalho produtivo?
Quando consigo uma boa linha — frase ou verso. Um dia excelente é quando escrevo de uma tacada só um poema ou parágrafo que me agrade.
• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
Ir descobrindo, enquanto escrevo, o que gostaria de dizer.
• Qual o maior inimigo de um escritor?
O apego excessivo ao texto.
• O que mais lhe incomoda no meio literário?
A vaidade e a falsa modéstia.
• Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Natasha Félix e Ronald Lincoln.
• Um livro imprescindível e um descartável.
A redoma de vidro, da Sylvia Plath. Descartável é qualquer um que prometa soluções rápidas e fáceis, como os de autoajuda.
• Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
Fazer concessões demais ou se render a soluções fáceis na escrita.
• Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Nunca diga nunca….
• Qual foi o lugar mais inusitado de onde tirou inspiração?
De um vestido florido sobre um piso de grama sintética.
• Quando a inspiração não vem…
Vou ler. Romance, poesia, filosofia, ensaio. Basta uma boa frase ou ideia para servir de fagulha para a escrita.
• Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Clarice Lispector. Ana Cristina Cesar. Anne Sexton.
• O que é um bom leitor?
Aquele que, ao te ler, pensa em coisas nas quais você não tinha pensado antes, depreende novos sentidos das entrelinhas.
• O que te dá medo?
Não conseguir mais escrever. Amar demais. Não amar o suficiente. Perder alguém que amo.
• O que te faz feliz?
Ser testemunha ocular da vida e do desenvolvimento dos meus filhos. Escrever poemas. Praticar yoga. Estar com quem me faz sorrir. Dançar. Mergulhar no mar. Ser capaz de amar com todo meu corpo e coração.
• Qual dúvida ou certeza guiam seu trabalho?
Me ocupar daquilo que não sei ou que não conheço. Uso a escrita como uma forma de entendimento, de investigação. Escrever é enaltecer o “não saber”, tatear os “ses”, “talvezes” e “quases” do mundo.
• Qual a sua maior preocupação ao escrever?
Não explicar demais, não me repetir.
• A literatura tem alguma obrigação?
Despertar uma emoção. Tirar o leitor da zona de conforto. Se apresentar como uma nova possibilidade. Estimular a imaginação. Dentre tantas.
• Qual o limite da ficção?
O mesmo limite do sonho.
• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
Caetano Veloso.
• O que você espera da eternidade?
Que tenha um bom uísque. E uma pista de dança.