Poemas de Horacio Preler

Leia os poemas "Símbolos", "História", "O centro do poema", "A parede", "Palavra final" e "Tarefa do crepúsculo"
Horacio Preler, autor de “Silencio de hierba”
01/09/2011

­­Tradução: Ronaldo Cagiano

Símbolos

Um estrangeiro percorre as ruas
de uma cidade desconhecida.
O mistério termina
nos estranhos labirintos.
Os homens passam uns junto aos outros,
somente os velhos conhecidos se saúdam
com as cerimônias de costume.
Entendemo-nos pobremente,
apenas delineamos os contornos do gesto
articulando símbolos heróicos
para superar o desamparo.

História

Um olho carregado de nostalgia
nos elimina sem pausa.
No entanto, retomamos o mundo,
damos consistência à idéia,
formamos conjeturas.
Tudo é inútil,
as artérias se endurecem,
a pele não pode continuar sua missão,
destina-se o doce ardor do sangue.
Maltratados,
envenenados pelo tempo,
nós deslizamos pelas ruas
como enormes animais históricos
em busca da morte.

O centro do poema

As árvores celebram a proteção do vento,
as tormentas resistem,
emitem sons diferentes.
Resvalam papéis jogados ao ar
e o óxido se acumula.
Os canais de rega se abrem para todos,
a água é um elemento contagioso.
Capturamos notas lançadas sem sentido.
Seguramente vão dar no centro do poema,
mas apenas quando notamos uma estranha dor.

A parede

Todas as manhãs um homem
levanta as paredes de sua casa.
Sobe nos andaimes; o sol brilha em sua pele.
Embaixo, seus filhos brincam com a areia.
Está sozinho.
Talvez pense na mulher que teve
ou na época em que foi feliz.
Quando termina seu trabalho,
recolhe suas ferramentas
e volta pelo mesmo caminho que chegou.

Palavra final

Hoje regressamos da infância
quase sem nos darmos conta,
sem por nos registros a hora da partida.
Voltamos do passado
com a retina ferida e o osso carcomido.
Os dedos pareciam dardos
arremessados sobre um branco perfeito,
marcas das unhas sobre a pele
e uma profunda peregrinação
tomava o lugar iluminado da carne,
aquilo que integra o mel e o leite
da última palavra.

Tarefa do crepúsculo

Do crepúsculo obtenho as razões para viver
os perfumes mais velhos,
as migalhas mais claras.
Cada crepúsculo em sua tarefa.

Extraio o melhor
e o estendo sobre a grama.
Disse finalmente: aqui estou,
sem acertos nem erros,
estou aqui.
Sou a palavra que perdura.

Cada dia se perde
no estado formal da escuridão.

Horacio Preler
Poeta, ensaísta e historiador. Nasceu em 1929, em La Plata (Argentina). É autor de mais de trinta livros, entre os quais Lo abstracto y lo concreto (1973), Oscura memoria (1992), Zona de entendimiento (1999) e Silencio de hierba (2001). Recebeu em 2002 a ordem Chevalier des Arts et des Lettres, do governo francês.
Ronaldo Cagiano

Nasceu em Cataguases (MG). Formado em Direito, está atualmente radicado em Portugal. É autor de Eles não moram mais aqui (Contos, Prêmio Jabuti 2016), O mundo sem explicação (Poesia, Lisboa, 2018), Todos os desertos: e depois? (Contos, 2018) e Cartografia do abismo (Poesia, 2020), entre outros.

Rascunho