Poemas de Daniela Galdino

Leia os poemas "futuro sob controle", "oferenda" e "arpejo"
Daniela Galdino, autora de “Inúmera”
01/05/2021

futuro sob controle

agô!
já posso abrir o búzio das palavras?

na cinza da fogueira desmedida
resta o pó das fotografias

sinto:
carpideiras em seu ofício gratuito
vertem cachoeiras interditadas
lágrimas não transportam o vírus
submergem os pontos cardeais

escuto:
a orquestra das mães em desalinho
reabre o suntuoso teatro nacional
sinfonia lembrando a morte
dos filhos e sonhos extraviados

vejo:
fascismo é lembrança em desuso
nas casas, cabeças e cacimbas
os necropolíticos pomares
agonizam colheitas inférteis

leio:
há gritos em braile nas ruas e becos
respostas que ainda cochilam
nas cartas dos artistas tombados

escrevo:
findou-se a crise
eis a vida preservada

…..

oferenda

deitei a coroa de medos
no barco das incertezas
agora repouso perplexa
nas velhas tábuas das marés

…..

arpejo

a boca do sertão
impiedosa
engole meus desalinhos

arco verde, flecha tonta
sagas abertas coração ferido

urgências de canto
estufa esquife estúdio

a boca impiedosa
diz culpa
se eu desistir

Daniela Galdino

É baiana, poeta, performer, produtora cultural, docente da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Publicou Espaço visceral (2018), Inúmera/Innumerous (edição bilíngue, tradução Brisa Aziz, 2017), Inúmera (2011).

Rascunho