Poemas de Antônio Mariano

Leia os poemas "Você não sabe o que é a solidão", "Tropeços", "Fogo" e "Arte poética"
Antônio Mariano, autor de “Entrevamento”
01/03/2022

Você não sabe o que é a solidão

No dia em que você se estranhar,
encher o saco de você
para descartar,
os garis
taparem
o nariz,
e se o pó
que virá após
os fizer tossir,
você está só.

Não importa com quem você more,
mãe, pai, irmãos, mulher ou filhos,
no more, no more,
você está só.

E se depois de tudo
você sorrir
da própria desgraça,
seu irresponsável,
sem compromisso
com alguma fé,
vá, faça
o sinal da cruz,
ajoelhe e reze,
e peça perdão.

Você não sabe o que é a solidão.

Tropeços

Quase nunca é sol
quando amanheço.

Para expiar minhas virtudes
rezo um terço.

A solidão é destino
sem começo.

Pra que cantar na chuva
se entristeço?

Educação do estranhamento
vem do berço?

Isso de forjar a própria vida
tem um preço.

Fogo

para Francisco Cesar Gonçalves

Irmão, não, não desistas
eles te querem na pista
pra passar por cima
e não, não procures a rima
em vão; pega a tua arma
a poesia serve e alarma
mas vai, vai sem arroubos
se há racistas, fogo
fogo nesses vermes
aí verás os claros germes
de trigo do amanhã
coriscos e relâmpagos
abrindo-os ao meio,
e nós passaremos sem freio.

Arte poética

A poesia é maneta e cega
e, tátil, percebe,
basta o que vale

dedos dançando em braile,
devassa cânions,
montes parte-os ao meio,
fornece a Penélope
todos os novelos

um a um datilografa
os vermes ágrafos
que vivem no papel

quando toca a pele
dos paquidermes.

Antônio Mariano

Nasceu em João Pessoa (PB). Foi colunista do jornal paraibano A União por cinco anos. Mais tarde editou treze números do Correio das Artes, suplemento literário desta mesma publicação. É autor de, entre outros, Guarda-chuvas esquecidos (Poesia, 2005), Sob o amor (Poesia, 2013), O dia em que comemos Maria Dulce (Contos, 2015) e Entrevamento (Romance, 2021). Apresenta, aos sábados, o programa Tome Poesia, Tome Prosa, canal de literatura que mantém no Youtube.

Rascunho