🔓 Vidraça_dezembro_2010

03/11/2011

 

Chico Buarque: 30 mil reais e glória

Casca grossa
Leite derramado, de Chico Buarque, editado pela Companhia das Letras, foi eleito o livro de ficção do ano pelo júri do Prêmio Jabuti. Trinta mil reais para ele, fora a glória. Quem não gostou foi o pessoal da Record, que viu seu candidato, o livro Se eu fechar os olhos agora, de Edney Silvestre, ser preterido em favor de Chico. A reclamação: o romance do jornalista da TV Globo, pouco tempo antes, já havia sido apontado como o melhor do ano, pelo mesmo Jabuti, superando o do compositor, que conquistara somente o segundo lugar. Levantaram-se, pois, as bandeiras de guerra. A Record protestou contra a incoerência de tal decisão e, em carta aberta à população, anunciou seu boicote à premiação do ano que vem. De acordo com Sergio Machado, presidente do grupo Record, ele não inscreverá seus lançamentos no Jabuti de 2011 (uma resolução não totalmente irreversível, fique claro). A revolta correu solta pela internet, e rolou até abaixo-assinado exigindo de Chico a devolução do prêmio.

Cristo contra Chico
Da parte da Companhia, Luiz Schwarcz publicou texto defendendo Chico e lamentando a resolução do concorrente na Folha de S. Paulo — acusando-a, inclusive, de antidemocrática. No Twitter da editora, destacou-se inclusive que, dentre as assinaturas anti-Chico colhidas pela petição de revoltosos, estavam até as de Jesus Cristo, Dom Quixote e Pedro Álvares Cabral. Tanto Schwarcz quanto Machado, porém, propuseram mudanças para o prêmio de 2011, coisas como a diminuição do número de categorias premiadas e o aumento da grana destinada aos avaliadores das obras. A CBL, entidade que promove o Jabuti, avisou que curtiu algumas das sugestões. Portanto, é possível que, ano que vem, tenhamos a impressão de que algo mudou.

Mas quem ganhou?
Chico Buarque, até o fechamento desta edição, não havia abdicado do título concedido ao seu Leite derramado. Já o prêmio de melhor livro de não-ficção foi dado a Maria Rita Kehl, pela obra O tempo e o cão, da Boitempo, vencedora da categoria Educação, psicologia e psicanálise. Foi o que bastou para que parte da “direita” chiasse ainda mais, acusando os jurados do Jabuti de terem se pautado pelas preferências políticas dos vencedores, já que Chico e Maria Rita seriam notórios eleitores de Dilma — também uma vencedora.

O romance venceu
Enquanto isso, a diretora editorial do grupo Record, Luciana Villas-Boas, provocava outra polêmica no mundo literário. Na edição de novembro da Revista da Cultura, declarou, em matéria assinada por Kelly de Souza: “Considero um equívoco começar a carreira com livros de contos, ou poesia, ou crônica. Esses gêneros não têm público e os livreiros começam a associar o nome do autor a fracasso de vendas. Melhor publicar esses gêneros em outros veículos e investir tempo, pesquisa e estudo na construção de um romance”. Portanto, acabou: é o fim da poesia, da crônica e do conto brasileiros. Poucos, porém, lembraram que Edney Silvestre, antes de lançar seu primeiro romance, Se eu fechar os olhos agora, publicou, também pela Record, dois livros de crônicas: Dias de cachorro louco e Outros tempos.

Jô Soares

Leia o gordo
Chico também venceu o Portugal Telecom. Glória um pouco menor que a do Jabuti, mas bem compensada pelos cem mil reais que o prêmio paga. Só que, aí, a estrela da história foi o humorista Jô Soares, escolhido para ser o apresentador da cerimônia de entrega das premiações. Jô levou o cenário do seu programa global ao palco do Portugal Telecom, com banda e tudo, e, ao entrevistar o escritor laureado ao vivo, lembrou a ele que o crítico Wilson Martins, morto em janeiro deste ano, considerava a ambos — Chico e Jô — escritores amadores. Uma saia-justa e bastante deselegante: ressuscitar críticas negativas a um autor premiado justamente na hora da sua premiação pública.

Wilson de novo?
Wilson fez críticas, sim, à obra de Chico e Jô. Quais? Numa entrevista a José Castello, por exemplo, ele disse o seguinte: “Jô Soares e Chico Buarque podem escrever qualquer coisa, que serão sempre lidos. Eles, a rigor, não podem sequer ser considerados escritores profissionais. (…) Fazenda modelo (de Chico) é apenas um recozimento de Animal farm, de George Orwell. Estorvo, por sua vez, é o recozimento de Zero, de Ignácio de Loyola Brandão, que, aliás, é um livro bem mais interessante. A relação entre Estorvo e Zero é tão escandalosa que me espanta como, na época do lançamento de Estorvo, nenhum resenhista tenha a ela se referido”.

Mais Portugal
O Portugal Telecom, em todo caso, teve outros vencedores, e é bom lembrá-los aqui: em segundo lugar ficou o romance Outra vida, de Rodrigo Lacerda, e em terceiro, Lar, do poeta Armando Freitas Filho.

Joca, Schroeder e Adélia
À sombra de todas essas polêmicas, a Fundação Biblioteca Nacional também anunciou os vencedores de seus prêmios literários. O Machado de Assis, entregue ao melhor romance do ano, ficou com Do fundo do poço se vê a lua, de Joca Reiners Terron; o Clarice Lispector, que premia o melhor volume de contos do período, foi para As certezas e as palavras, de Carlos Henrique Schroeder; e quem levou o Alphonsus de Guimaraens, de melhor livro de poemas de 2010, foi Adélia Prado, com A duração do dia.

Moacir, a mídia e as coincidências
O escritor cearense Moacir Costa Lopes, autor de A ostra e o vento e Maria de cada porto, morreu no dia 21 de novembro, aos 83 anos, vítima de câncer. E, em muitas das notas que a imprensa brasileira publicou a respeito de sua morte, era possível ler referências ao fato de que, um dia, Chico Buarque e ele foram parceiros musicais. É de Chico a canção-tema do filme A ostra e o vento, baseado na obra de Moacir e dirigido por Walter Lima Jr.

Rachel inédita
No dia em que Rachel de Queiroz completaria cem anos, 17 de novembro, o Instituto Moreira Salles lançou um livro inédito da autora de O quinze. Trata-se de Mandacaru, coletânea de dez poemas que a escritora teria produziu ainda aos 17 anos. A organização da obra, de 160 páginas, ficou por conta de Elvira Bezerra.

Jornalismo cultural
De 8 a 10 de dezembro, acontece o 3.° Seminário Internacional Rumos Jornalismo Cultural, na sede do Itaú Cultural (Av. Paulista, 149), em São Paulo. Participam dos debates profissionais como Alex Needham (The Guardian), Blake Eskin (New Yorker), Cassiano Elek Machado, Luis Antonio Giron, José Castello, Humberto Werneck, Marcelo Costa e Stuart Stubbs (Loud and Quiet), entre vários outros. A entrada é franca, e os ingressos serão distribuídos no local, com meia hora de antecedência.

Paiol especial
No dia 6 de dezembro, às 20 horas, acontece a última edição do Paiol Literário do ano. E a noite será especial, por conta do convidado do evento, o escritor José Castello, mediador original do evento. A moderação será do editor do Rascunho, Rogério Pereira.

Revista Arte e Letra

Curtinhas
A edição K da revista literária Arte e Letra: Estórias, da editora curitibana Arte e Letra, já está circulando. Neste novo volume de textos curtos, a publicação reuniu trabalhos de Samanta Schweblin, Joca Reiners Terron, César Vallejo, valter hugo mãe, O. Henry, Oscar Wilde e Ivo Barroso. As ilustrações são do artista plástico Alfredo Andersen.

 

Revista Coyote

21 coiotes
Saiu a nova edição da revista Coyote, editada pelos poetas Ademir Assunção, Marcos Losnak e Rodrigo Garcia Lopes. O número 21 da publicação londrinense traz poemas do espanhol Leopoldo Maria Panero, narrativas e versos inéditos de Wilson Bueno, um conto de João Gilberto Noll (também inédito), aforismos de Franz Kafka, uma entrevista com a crítica literária norte-americana Marjorie Perloff e um ensaio de Jair Ferreira dos Santos. E mais: Mariana Ianelli, Mario Domingues, Ivan Justen Santana, Marco Fabiani e Priscilla Buhr complementam a edição. Mais informações sobre como comprar a Coyote, no site www.iluminuras.com.br.

Esdras no bule
O coletivo literário O Bule anuncia o próximo convidado de suas sabatinas. A partir do dia 10 de dezembro estará no ar, no www.o-bule.blogspot.com, uma longa entrevista com o escritor piauiense radicado no Rio Esdras do Nascimento, autor de Lição da noite.

Rascunho