Planejar, organizar, preparar e montar uma exposição, dentre as inúmeras atividades em que eu me meto, é, sem dúvida, a mais enlouquecedora. E, óbvio, uma das mais gratificantes. Essas coisas andam juntas.
Desde muito novo, meu filho me ajuda. Acabou se transformando em um ótimo montador e com uma visão espacial fantástica. Sugere mapas expositivos, organiza obras, monta expografia, tudo. E, claro, foi cursar Ciências Econômicas.
A vida não é linear.
Abrirei uma exposição individual nova no MIS de Campinas em julho e já estou surtando desde agora. Parte importante do estresse é que, dessa vez, não poderei contar com a ajuda de filho e farei tudo sozinha.
Claro, parte por desespero e parte por saudades, fiquei lembrando da primeira vez em que ele montou uma exposição comigo. Foi em 2010. Ele tinha 9 anos. Era uma coletiva e a gente só montou as minhas obras. Foi ele quem solucionou o problema de uma viga no meio do caminho. Em 2010 ele já tinha a minha altura.
Achei no Spotify uma música infantil russa que meu filho ouvia quando ainda cabia no meu colo, Chunga-Changa, de Wladimir Jakowlewitsch Schainski. A internet é essa coisa linda que, inclusive, me forneceu uma animação fofa da música.
Ele ouvia repetidamente essa e Duerme Negrito, da Mercedes Sosa, que eu cantava para ele bebê, no colo, dando beijinhos nos pezinhos quando chegava a parte de Y Zas! Le come la patita; Chacapumba, chacapumba, apumba, chacapumba. Ele ficava esperando e antes mesmo do Y Zas, já caía na gargalhada.
Hoje é um homem enorme de 1,86m de altura e barba cheia. Gosta de um monte de música velha, adora os clássicos no cinema e lê uns teóricos que nem conheço como se fossem gibis. Para mim, terá sempre a gargalhada no Y Zas! e caberá no meu colo, ainda que apenas metaforicamente.
Rogério Pereira escreveu um texto lindo, que eu tive a honra de ilustrar, para a edição em que o Rascunho completa seus 23 anos. Os traumas familiares — sempre existem e, se você acha que não, é você a origem do problema — são diferentes, mas a descrição que ele faz de seu filho, o velho, é assustadoramente familiar.
Como sempre, os textos do Rogério me impactam, mexem, movem, redemoinham dentro de mim. “Minha vingança é literalmente silenciosa. Não se trata de vingança, na verdade.”, ele diz. Eu entendo. A gente só discute, só briga, quando acha que vale a pena. Para todos os outros, o silêncio.
Ainda bem que os filhos existem para nos manter no prumo.
A cada dia que passa, mais gente habita o cone do silêncio.
E assim, de mudez em mudez, somos todos velhos.