É que as palavras tambĂ©m nos soterram, sabe? VĂŞm, assim, numa enxurrada, quase tĂŁo vertiginosas quanto a sucessĂŁo de imagens que esse mundo de discrepantes mundos nos tem despejado, de hora em hora, num repasto atroz, essas palavras, essas imagens, que vamos pondo para dentro sem muito ruminar, ou entĂŁo ruminando, os olhos parados, ruminando, sem compreensĂŁo que solucione, que as assimile, a essas palavras e a essas imagens que nos chamam sem descanso a comparecer e tomar nossa parte no assunto da vez, na dor mais fresca, no escândalo hodierno, venha cá, nĂŁo vire a cara, veja, veja e nos diga o que vocĂŞ pensa disso, como Ă© que isso lhe chega, como lhe cai, venha, nos diga, mas e se de tanto ver vocĂŞ tonteia nauseado, nĂŁo porque lhe sobre espanto, ou lhe falte repertĂłrio, que a essa altura encanecida da vida nĂŁo lhe cabe mais direito Ă ignorância, apenas que de tanto ver e andar metido nessa galeria de zumbidos vocĂŞ de fato sente um enjoo, que nĂŁo Ă© tanto do estĂ´mago senĂŁo do corpo todo, irradiando bem do meio para os pĂ©s, os braços, a cabeça, um enjoo como de uma flor pestilenta que se lhe fosse abrindo por dentro, uma pontada no peito, outra pontada mais forte, e as exclamações nesse momento sĂł lhe servem como signo de queda, rastro de bátega, e Ă© no seu peito mesmo que batem, na sua cabeça, estarĂŁo talvez forjando qualquer coisa ainda informulável, aos menos as palavras ainda nĂŁo dĂŁo conta de extrair força do meio da impotĂŞncia, nenhuma forma conclusiva desses sucessivos bombardeios, se nem mesmo Susan Sontag ousava dizer que alcançava a dor e o horror de certas imagens, e se entĂŁo vocĂŞ der de pensar que num cĂ©u noturno pouco mais acima do cĂ©u das bombas tudo Ă© silĂŞncio, e que existe algo atroz tambĂ©m aĂ, e se lhe acontecer nesse momento de urrar por dentro, surdamente, sem somar zumbido Ă quele da grande colmeia, Ă© que as palavras, como as imagens, tambĂ©m nos soterram.