(09/12/20)
Essa semana encontrei o arquivo de um poema que escrevi em março, quando a pandemia chegou ao Brasil. Nos breves segundos entre clicar no documento e esperar que abrisse, pensei no quanto mudei desde então, no quanto já estou distante daquela mulher assustada que saiu estocar álcool e fugiu de São Paulo, indo passar um tempo na casa dos pais em outra cidade. Também pensei no quanto mudamos juntos, pisando além dos medos para voltar a viver.
Passaremos, diz o poema que ainda segue atual. Uma pena que quase duzentas mil pessoas não passarão com a gente.
Passaremos,
não todos mas passaremos,
eufóricos por sentar em mesas de bar
ou ir ao trabalho numa segunda-feira
ou mesmo pegar uma nota de dez e
tocar sem medo a arara,
tocar sem medo cabelos
e beijar bocas suspeitas
(são sempre melhores as bocas suspeitas).
E então voltaremos
de olhos mais abertos
a ver beleza onde não vÃamos
pelo tempo curto e radiante que dura a beleza.