Uma valsa com o leitor

Leticia Wierzchowski: "A ficção estipula seus próprios limites. Ficcionar é também subverter a realidade"
Leticia Wierzchowsk Foto: Calin Mandelli
01/12/2013

Se a literatura tem uma obrigação, para a gaúcha Leticia Wierzchowski é levar o leitor, como uma boa dançarina. O cenário ideal para esta valsa: um lugar tranqüilo, com uma bela vista, alheio às preocupações do dia-a-dia. Nascida em 1972, Leticia publicou mais de quinze livros desde sua estréia na literatura, aos 25 anos. São romances, novelas, crônicas, infantis e infanto-juvenis, entre os quais se destacam A casa das sete mulheres, que inspirou a série homônima da Rede Globo, e o recém-publicado Sal, em que os membros de uma família finalmente ultrapassam os limites de sua pequena ilha natal, impulsionados justamente pela escrita de um romance. Neste Inquérito, Leticia revela os prazeres no ofício de escritora e alguns de seus mestres literários.

Quando se deu conta de que queria ser escritora?
Quando descobri que a melhor parte do meu dia transcorria quando eu estava escrevendo. 

Quais são suas manias e obsessões literárias?
Eu não tenho muitas manias. Mas tenho um hábito: escolher um romance, um romance a meu ver admirável, que passeie pelo universo do livro que tenciono escrever, e deixá-lo sobre a minha mesa diariamente enquanto trabalho — uma espécie de talismã.

Que leitura é imprescindível no seu dia-a-dia?
Não abro mão de um bom romance.

Se pudesse recomendar um livro à presidente Dilma, qual seria?
Uma casa para o Sr. Biswas, V. S. Naipaul.

Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
Uma porta fechada e uma janela aberta para o azul ou para o verde.

Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Com o mar atrás das páginas.

O que considera um dia de trabalho produtivo?
Aqueles dias em que a chatice da vida prática não se intromete no meu trabalho ficcional. Odeio começar a trabalhar animada, e terminar com gosto de CNPJ na boca.

O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
Sempre penso num poema da polonesa Wislawa Szymborska, A alegria da escrita. É bom brincar de ser um deus nas minhas páginas.

Qual o maior inimigo de um escritor?
A soberba.

O que mais lhe incomoda no meio literário?
A soberba de certas pessoas. 

Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Adriana Lunardi e Claudia Tajes.

Um livro imprescindível e um descartável.
Imprescindível: Memórias de Adriano, Marguerite Yourcenar. Descartável? Não sei… São tantos. Mas, de um autor que admiro, me decepcionei muito com O sonho do celta, do Vargas Llosa.

Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
Personagens anêmicos, sem força. Sinto que andamos cheios deles por aí.

Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Ficção científica.

Qual foi o canto mais inusitado de onde tirou inspiração?
O armário de guardados da minha mãe.

Quando a inspiração não vem…
Vou nadar.

Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Somerset Maughan.

O que é um bom leitor?
Aquele que sempre tem um livro por perto.

O que te dá medo?
A violência urbana.

O que faz você feliz?
Meus filhos gostarem de ler me faz muito feliz.

Qual dúvida ou certeza guia seu trabalho?
Vou em frente de dúvida em dúvida.

Qual a sua maior preocupação ao escrever?
Fazer com que seja possível sentir e acreditar. A premissa de um bom livro de ficção é que ele tenha coerência interna.

A literatura tem alguma obrigação?
Levar o leitor, como uma boa dançarina.

Qual o limite da ficção?
A ficção estipula seus próprios limites. Ficcionar é também subverter a realidade.

Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
Mario Quintana.

O que você espera da eternidade?
Algum espaço nas bibliotecas.

Rascunho

Rascunho foi fundado em 8 de abril de 2000. Nacionalmente reconhecido pela qualidade de seu conteúdo, é distribuído em edições mensais para todo o Brasil e exterior. Publica ensaios, resenhas, entrevistas, textos de ficção (contos, poemas, crônicas e trechos de romances), ilustrações e HQs.

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