Tempo de espera

O momento de estagnação é o inferno dos ansiosos, mas pode ser importante para exercitar a capacidade de esperar
Ilustração: Eduardo Mussi
07/07/2024

Não há nada em movimento. O vento nem sopra. Tudo parece à espera. O tempo em geral e o meu tempo próprio. O que (não) germina debaixo dessa terra, inclusive debaixo do meu chão, não sei. O tempo de espera se estende pelos mares, onde não há barco chegando nem partindo. Pode haver em outros horizontes, mas do ponto onde vejo, a partir do eixo onde finco meus pés, não há nada. Nem ondas. Os peixes submergiram em um silêncio profundo.

Tento perceber algum movimento lento, uma folha de árvore se mexendo, mas não. O tempo de espera é o nada existindo em plenitude angustiante. Não se parece com gestação porque não ouço a respiração do que virá.

Esse momento de estagnação é o inferno dos ansiosos como eu, mas pode (ou deveria) ser importante para exercitar a capacidade de esperar — a colheita, a pesca, a chegada, não se sabe do que exatamente. A imprecisão do que me aguarda depois deste tempo suspenso é um tormento que talvez seja necessário. Tento experimentar a fé.
Sonho com o dia em que os barcos voltarão a surgir, e o movimento das águas vai me mostrar crianças e velhos brincando nas praias.

Penso no dia em que a espera entediante vai ser apenas uma memória confusa e mentirosa. Vou poder catar as conchas que o mar trouxer, sentir que o vento existe novamente e até pegar um por um os tomates que voltarão a nascer em algum lugar.

Por enquanto, tudo para mim está inerte e vazio… O jeito é aguardar.

O experimento da fé é o que eu tenho por agora e agarro com força esse punhado de esperança.

É como se o mundo parasse só para mim, pois os vizinhos continuam indo e vindo, sorriem alheios à estagnação. Então percebo que a inércia só existe para mim.

Dentro do meu tempo de espera estou em uma ilha envolta por um mar de plástico onde nada se move. Quem nunca se sentiu assim?

Queria notícias de quem momentaneamente habita uma dessas ilhas. Um recado, uma mensagem na garrafa, qualquer coisa. É bom saber que não se está sozinho neste tempo de espera que parece eterno.

Claudia Nina

É jornalista e escritora, autora dos infantis A barca dos feiosos, Nina e a lamparina, A repolheira Ana-Centopeia, entre outros. Publicou os romances Esquecer-te de mim (Babel) e Paisagem de porcelana (Rocco), finalista do Prêmio Rio. Assina coluna semanal na revista Seleções. Seu trabalho mais recente é a participação na antologia Fake fiction (Dublinense). Alguns textos da coluna da Seleções estão no seu podcast, disponível no Spotfy, lidos pela própria autora.

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