Galões

As enormes pretensões de uma costureira em início de carreira em busca da blusinha perfeita (ou quase)
Ilustração: Kleverson Mariano
20/07/2023

Costura é um hobby cada vez mais presente na minha vida. Comprei um manequim para (tentar) fazer umas blusinhas pra mim. Na minha cabeça, ficaram lindas. Só me falta aprender a modelar.

Outro dia vi uma galoneira em uma vitrine. Babei, roxa de inveja. Comentei com filho. Obviamente, as primeiras perguntas foram: o que é uma galoneira, do que se alimenta, como se reproduz, onde habita, o que faz. Expliquei que é a máquina que faz o acabamento em golas, mangas, barras de calças, essas coisas. É uma máquina para essa costurinha no final do tecido. Essa costurinha se chama galão, daí o nome.

Ele pareceu muito surpreso que seja necessária uma máquina especial para isso. Expliquei que dá para fazer um acabamento falso usando o ponto de zigue-zague da máquina reta, mas que não fica tão bom e dá muito mais trabalho.

O que é uma máquina reta? É a que eu tenho. Ah, tá.

Continuei, empolgadíssima, falando sozinha.

Perdi o interesse da audiência muito rapidamente.

Estou em um caminho que já percebo sem volta.

O problema é que estou, nesse momento, no limbo. Ainda não sei modelar, mas já estou arrogante o suficiente para passar na frente de lojas de roupas, ver algo que me agrada e não comprar porque, muito em teoria, sou capaz de fazer. Essa possibilidade, claro, funciona apenas na minha cabeça, já que até agora não consegui fazer uma única blusinha sequer. Ou seja, em breve não poderei mais sair de casa por falta do que vestir.

O que me deixa ligeiramente otimista (e presunçosa) é que quando eu comecei a fazer pães foi a mesma coisa. Os primeiros devem estar em algum projeto do Minha casa, minha vida ou sustentando um dos novos prédios da vizinhança.

Descobri uma empresa que imprime sobre tecido, qualquer tecido. Meu plano é imprimir o molde no tecido e deixar o molde aparente, como uma estampa, com todos aqueles tracinhos, números, etc. Assim como a piada prática das tomadas (crônica passada), essa é mais uma das coisas que provavelmente só eu acho hilária. Não ligo. Rir sozinha é uma filosofia de vida.

Nina está preocupada, mas hoje ela tem telhado de vidro. Tentou pegar a bola de um malabarista de rua, quase me derruba no chão e ainda fez cara de quem foi injustiçada. Detalhe: a bola estava pegando fogo.

Hoje, a doida é ela.

Carolina Vigna

É escritora, ilustradora e professora. Mais em http://carolina.vigna.com.br/

Rascunho