(…) As guerras nunca trazem nada de bom,
fazem-se porque é disso que os homens gostam (…)
O mundo é feito de guerras, desde que a história é a história. E assim caminha a humanidade, construindo um ser humano que nunca viu, na verdade, um tempo duradouro de paz. O primata mais antigo levantou um grande osso e deu, com força, no corpo de outro primata. Mais do que a cena do filme de Kubrick, trata-se de uma realidade que se repete há muito em retinas tão fatigadas de dor. A violência faz parte deste ser, chamado humano, desde as origens.
O bicho homem sempre teve, à mão de semear, um osso-arma, para atingir o seu semelhante. As pequenas e grandes guerras que os homens inventaram (pois temos de lhes dar este crédito, já que a guerra é uma invenção do bicho macho) são o nosso pão diário, que um qualquer diabo inventou, e, em pleno terceiro milênio, ainda não saímos da estrada sinuosa, que nos tem levado a lugar nenhum.
E se uma guerra tivesse o nome de mulher? Seria mais tranquila, menos violenta, mais conciliadora, uma guerra justa? Existem guerras justas? Ou seria uma guerra igual a muitas? Não há bolas de cristal, e, portanto, não há vaticínios por detrás da bruma fina à frente dos olhos. Quando muito, existe a arte para pintar mares, talvez navegáveis, em tempos de bonança.
E assim é, no texto dramatúrgico, Tanque, de Sofia Perpétua, no qual existe um caminho de guerra no feminino; ou seja, uma via antibélica, que contraria o discurso repetitivo de homens e os seus “pequenos” brinquedos de morte. A sua personagem construída para o efeito chama-se Nádia, que traça uma linha imaginária, que também construímos no nosso íntimo, até uma fronteira onde um conflito contemporâneo se desenrola.
A jovem decide roubar um tanque militar para ir buscar o seu irmão à frente do combate. Fazemos esta viagem cheia de percalços com ela, entre risos, preocupações, medos vários, e até uma certa ingenuidade (talvez pensada, ou não, pela escritora), na esperança de um final feliz. Na sua jornada até algures, ela encontra outros deserdados da guerra, os que sofrem pelo conflito e aqueles que irão sofrer. São as vozes das personagens, mas também dos lamentos daqueles que sequer são ouvidos em qualquer conflito.
A guerra de Nádia, quando lemos o texto de Sofia, não é tão dolorosa como uma qualquer notícia sobre a Ucrânia, a Palestina, ou outra região do planeta. A realidade magoa mais do que qualquer ficção, vista do nosso lugar de conforto. Contudo, este tanque, no âmago do seu invólucro, carrega a dimensão poética da paz; talvez a solução para sairmos, de vez, da cepa torta.
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