🔓 Vidraça

A um ano do centenário do autor, editoras preparam lançamentos e reedições da obra de Cortázar no Brasil
01/08/2013
Luiz Felipe Leprevost, editor e autor do selo Encrenca
Luiz Felipe Leprevost, editor e autor do selo Encrenca


Como ela se fez por si mesma
Encrenca — Literatura de Invenção é o mais novo — e talvez ousado — selo editorial de Curitiba (PR). Idealizado pelos escritores Otavio Linhares (editor da revista Jandique) e Luiz Felipe Leprevost e pelos editores Thiago e Frede Tizzot, da Livraria e Editora Arte & Letra, o nome rende homenagem a Manoel Carlos Karam e se inspira em autores como Valêncio Xavier e Jamil Snege para publicar livros “inventivos que apostem na singularidade”. Ainda mais ambiciosos, os editores querem uma literatura que “redimensione o conhecido, invente o jamais visto”. Os três primeiros títulos, com tiragem de 250 exemplares cada, são Réquiem para Dóris, de Oneide Diedrich; Salvar os pássaros, de Leprevost; e Pancrácio, de Linhares — todos autores paranaenses. Para o primeiro semestre de 2014, estão a caminho livros do carioca Botika, do curitibano Alexandre França e a estréia na prosa de ficção do dramaturgo carioca Roberto Alvim.

Lima para todos 1
Poucos dias depois da Flip 2013, surgiu nas redes sociais uma campanha para que a Festa Literária de Paraty homenageie Lima Barreto em sua próxima edição. Ela foi levantada com um comentário na internet pela jornalista Josélia Aguiar, ao qual se seguiu uma ampla mobilização por simpatizantes da causa. O blog Não gosto de plágio, da tradutora Denise Bottmann, reuniu exatas mil e uma assinaturas em prol do autor de Clara dos Anjos, já entregues à organização da Flip. Nomes como Bráulio Tavares, Cristovão Tezza, Luiz Costa Lima e Paulo Henriques Britto constam da lista de apoiadores que desejam que o autor seja mais lido e discutido.

Lima para todos 2
Entre os diversos motivos para que Lima Barreto, entre tantos outros grandes escritores brasileiros, seja o homenageado do evento em 2014, Josélia Aguiar levanta uma questão interessante: “Como ele está em domínio público, é ao mesmo tempo de todas e de nenhuma editora com exclusividade, encontrando-se assim numa condição comercial bem curiosa. Pode ser baixado e lido gratuitamente”. Abaixo, a jornalista critica o ostracismo em que se encontra a obra do autor e reafirma sua importância:

• Por que Lima Barreto, em meio a tantos outros autores que poderiam ser indicados?
Lima Barreto foi um dos três nomes citados na coletiva de balanço da Flip 2013. Começamos a apoiar sua escolha por vários motivos: a qualidade e variedade de obra, as questões que levantou um século atrás e que continuam extremamente atuais, seu significado na história literária e cultural do país. Existem ótimos autores para o evento ainda homenagear, é claro, mas talvez entre os ótimos ele seja o que está mais longe, hoje, dos holofotes. Como está em domínio público, encontra-se assim numa condição comercial bem curiosa: é ao mesmo tempo de todas e nenhuma editora com exclusividade, pode ser baixado e lido gratuitamente.

• Que benefícios a homenagem da Flip pode gerar a sua obra?
Como é um grande evento literário, a escolha de seu nome pode gerar curiosidade, debates e repercussão na imprensa. Isso já está acontecendo, aliás, só com essa movimentação de duas, três semanas: jornais, revistas especializadas e blogs começaram a falar mais de Lima Barreto. Diria que 95% dos que procuramos para apoiar reagem com muito entusiasmo. Entre o que rejeitam a idéia, há quem argumente que “Barreto não ia gostar de ser homenageado num grande evento como a Flip”. Discordo, pois ele sempre quis ser conhecido. Tentou mais de uma vez entrar para a Academia Brasileira de Letras, sem sucesso. Em seu diário, nota-se o quanto desejava ter seu valor de autor reconhecido. Não acho que faça sentido que um admirador de Lima Barreto torça contra. É como se estivesse contribuindo para o ostracismo, para que haja lugar para uns e não para outros, uma maneira torta de discriminar autor e público.

• Que outras ações deveriam ser feitas para que o autor fosse mais lido?
A publicação de reportagens e artigos por jornais literários como o Rascunho, por exemplo, é bem-vinda. Quem sabe uma edição especial? Seria muito bom incentivar a leitura de sua obra. Não penso apenas nos mais conhecidos, Recordações do escrivão Isaías Caminha e Triste fim de Policarpo Quaresma, como também em Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá, nos contos, diários, etc. Existem grandes livros sobre ele, a biografia que Assis Barbosa escreveu nos anos 1950 [A vida de Lima Barreto] foi considerada durante muito tempo a melhor escrita no país. Nicolau Sevcenko trata de Lima Barreto num dos livros mais importantes de nossa história cultural, Literatura como missão. No Facebook, existe uma página atualizada diariamente, sobretudo por Rodrigo Conçole, um dos que defendem a causa, assim como Denise Bottmann tem concentrado informações sobre autor em seu blog, Não gosto de plágio.

 

Maria Gabriela Llansol estréia no catálogo de estrangeiros da 7Letras
Maria Gabriela Llansol estréia no catálogo de estrangeiros da 7Letras

20 x 7
Aos vinte anos de idade, a carioca 7Letras passa por algumas mudanças: aposta na publicação sob demanda para viabilizar a edição de poesia, lança cerca de dez títulos por mês e expande a seção de literatura estrangeira. Porém, o foco continua na literatura nacional: “A editora se notabilizou ao longo dos anos pela descoberta de muitos autores então inéditos e que hoje são nomes importantes das letras nacionais”, lembra o editor Jorge Viveiros de Castro. Angélica Freitas, Bruna Beber e Alice Sant’Anna, três “revelações” da poesia nacional dos últimos tempos, tiveram seus primeiros livros editados pela 7Letras. Apesar de ser esta a área pela qual é mais conhecida, atualmente são as obras acadêmicas, especialmente em ciências sociais, a maioria dos lançamentos da casa. Em literatura estrangeira, novos títulos já estão contratados, a exemplo de Um beijo dado mais tarde, da portuguesa Maria Gabriela Llansol (1931-2008) , previsto para setembro, e da primeira edição da obra completa do poeta Ruy Belo (1933-1978), também português, no Brasil, que já começou a chegar às livrarias.

Estudos literários 1
Durante a última Flip, o Itaú Cultural apresentou quatro pesquisas sobre os “Movimentos atuais da literatura brasileira”. Enquanto o antropólogo Felipe Lindoso discutiu a indústria editorial, destacando a mudança no perfil das feiras — que do foco na venda de livros passaram a valorizar a informação sobre literatura, com debates e palestras —, o professor da UFES Fábio Malini tratou da presença da literatura nas redes sociais. Se a boa notícia é que o tópico é mais disseminado na web do que se imagina, a pesquisa mostra uma desconexão entre mercado editorial e jovens leitores no Twitter: a grande comunidade de retweets, comentários e disseminação em torno do livro é de perfis ligados à cultura adolescente (relacionada a ídolos pop, literatura de games e nerd), enquanto a comunidade de literatura “adulta”, da qual também fazem parte autores, editoras e imprensa especializada, apresenta um número muito menor de disseminação — e se relaciona/alcança minimamente o primeiro grupo. “A rede se tornou um manancial de novos críticos e mediadores da literatura, por onde as obras da nova geração e dos autores ‘mortos’ ganham vida e sobrevida”, afirma Malini no estudo.

Estudos literários 2
Se a pesquisa de Laeticia Jensen Eble sobre o perfil dos projetos de doutorado em literatura revela a tendência, em determinados estados, de se prestigiar autores locais e resgatar os que ficaram à margem em certas épocas, ela confirma a prevalência do cânone nos doutorados e, proporcionalmente, o pequeno grupo que formam os pesquisadores envolvidos no estudo dos nossos contemporâneos. Por outro lado, o trabalho do colunista do Rascunho João Cezar de Castro Rocha — com base nos dados do mapeamento internacional da literatura brasileira do Conexões Itaú Cultural — informa que o estudo da literatura brasileira contemporânea é mais expressivo no exterior em comparação com os números levantados por Laeticia. Para este dado, o crítico oferece duas hipóteses: a relação com o novo perfil (e conceito) de brasilianista — o estudioso da literatura brasileira no exterior muitas vezes é do próprio brasileiro que se profissionalizou em instituições estrangeiras e tem grande interesse nas manifestações contemporâneas da cultura — e o fato de professores brasileiros se mostrarem mais comprometidos com o cânone como garantia de legitimação do próprio trabalho de pesquisa. O Itaú Cultural pretende dar continuidade aos estudados e publicá-los em versão impressa em 2014.

Desafios no exterior (e aqui)
Também na programação paralela da Flip, Luciana Villas-Boas defendeu, em mesa do Brazilian Publishers, que o desafio da literatura brasileira no exterior é fazê-la acontecer primeiro no Brasil: “A primeira pergunta de um editor de fora é ‘quanto vendeu em seu país?’. E o número que temos é pífio”. Para a agente literária, a dificuldade em fortalecer o mercado interno e gerar mais visibilidade lá fora está na concentração do poder cultural no eixo Rio-São Paulo, na necessidade de capital social e popularidade dos autores para se destacarem e em um equívoco do mercado editorial: “Não publicamos para a população em geral — literatura de qualidade com grande público”. Sobre o tema, o editor norte-americano Chad Post apontou para um problema estrutural no próprio mercado dos EUA, cuja publicação — e venda — de obras traduzidas é muito baixa. Já a alemã Torsten Casimir, editora de livros infantis, reconhece que os estrangeiros interpretam erroneamente as baixas tiragens do Brasil, mas trabalha em um cenário mercadológico que, na sua área, após o fenômeno Harry Potter, busca best-sellers ou títulos que também interessem a leitores adultos. Além dos números, pesam igualmente nos infanto-juvenis os aspectos culturais das obras, que nem sempre são absorvidos em diferentes países.

 

A coleção de livros artesanais da Arte & Letra ganha sua edição nacional
A coleção de livros artesanais da Arte & Letra ganha sua edição nacional

Prosa artesanal
A coleção de livros artesanais da editora curitibana Arte & Letra fez sucesso entre os leitores e lança agora uma nova edição, com autores nacionais: El Gordo, conto inédito de Luiz Ruffato, e Uma questão moral, que reúne três contos de Cristovão Tezza, um deles inédito, serão lançados até o final do ano. Assim como os volumes de Flaubert, Edgar Allan Poe (esgotado) e Tchékhov, lançados em janeiro de 2013 e vendidos a R$ 65, a nova coleção será produzida artesanalmente, com impressão em tipografia e encadernação manual e tiragem limitada de 200 exemplares.

 

Luiz Ruffato por Osvalter
Luiz Ruffato por Osvalter

Flores e infernos
Além da publicação artesanal, Luiz Ruffato lança ainda este ano uma nova edição de Eles eram muitos cavalos. Será sua estréia no catálogo da Companhia das Letras, que publicará no ano que vem seu novo romance, Flores artificiais, sobre um engenheiro em depressão que intriga sua psicanalista ao contar apenas histórias ocorridas com outras pessoas, como se ele não tivesse vida própria. Já em 2015 será a vez de a pentalogia “Inferno provisório”, antes publicada pela Record, ganhar uma edição revisada e num único volume. Tal como estão hoje, os infernos provisórios de Ruffato somariam 816 páginas.

 

A um ano do centenário do autor, editoras preparam lançamentos e reedições da obra de Cortázar no Brasil
A um ano do centenário do autor, editoras preparam lançamentos e reedições da obra de Cortázar no Brasil

A volta de Cortázar
A um ano das comemorações do centenário de nascimento de Julio Cortázar , a obra do argentino ingressa no catálogo da L&PM: A autoestrada do Sul & outras histórias sai em formato pocket e com nova tradução, assinada por Heloisa Jahn. Este é o único livro do autor previsto pela editora. Já a Civilização Brasileira, que concentra a obra de Cortázar no Brasil, acaba de publicar uma nova edição de Bestiário — título de 1951 e até agora fora de catálogo no país — e lança no mês que vem uma edição comemorativa de O jogo da amarelinha, marcando os cinqüenta anos do livro.

Mar de histórias
A Nova Fronteira começa a reeditar neste mês a antologia de contos Mar de histórias. Organizada por Aurélio Buarque de Holanda e Paulo Rónai, ela traça um panorama do conto na literatura mundial, desde suas origens (no conto egípcio e nas lendas budistas) ao século 20. Flaubert, Gógol e Daniel Defoe estão entre a vasta seleção dos autores. A série será publicada integralmente, em dez volumes e com novo projeto gráfico, mantendo as apresentações e explicações dos organizadores quanto à escolha de cada conto.

Títulos de sucesso 1
Com um perfil similar à Paralela, da Companhia das Letras, e à Intrínseca, a carioca Valentina completa um ano de casa editorial. Além dos cinco títulos no catálogo, a editora lança outros quatro durante a Bienal do Livro do Rio de Janeiro, mantendo o estilo “literatura de entretenimento e obras de referência aclamadas em prêmios e principais veículos de imprensa internacionais”. Além de focar nos best-sellers, a Valentina investe em outro nicho de sucesso, voltado ao público jovem: temas como urban fantasy, distopia, thriller e chick-lit estão entre suas preferências, sem deixar de lado obras de cunho religioso.

 

A best-seller Françoise Héritier é uma das apostas da Valentina
A best-seller Françoise Héritier é uma das apostas da Valentina

Títulos de sucesso 2
Depois de publicar uma obra sobre Rin Tin Tin, aclamada nos EUA; um romance da norte-americana Laurie Halse Anderson sobre a crueldade e a violência nas escolas; e uma obra sobre ioga escrita por um jornalista do NYT, a editora aposta em O sal da vida, com reflexões sobre os pequenos prazeres da vida pela escritora e antropóloga Françoise Héritier . O livro já vendeu cerca de 300 mil exemplares e está na lista dos mais vendidos na França há mais de 35 semanas, além de ter sido traduzido para sete línguas. À frente da Valentina está o publisher Rafael Goldkorn, pupilo de Ênio Silveira na Civilização Brasileira até se tornar editor-executivo da Bertrand Brasil, somando vinte anos de mercado editorial.

Ano da Copa 1
Tem início neste mês a quinta edição da Copa Brasileira de Literatura, que coloca dezesseis narrativas longas publicadas em 2011 e 2012 na disputa inicial. Os livros são resenhados por um júri — integram, entre outros, o escritor Juan Pablo Villalobos e o colaborador do Rascunho Raphael Dyxklay, integrante da comissão organizadora — e passam para as etapas seguintes. Nas oitavas de final, uma partida interessante é a de Vermelho amargo, de Bartolomeu Campos de Queirós, vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura em 2012, e Os hungareses, de Suzana Montoro, que também levou o Prêmio São Paulo, na categoria livro de estréia. Acompanhe os jogos em copadeliteratura.com.br.

 

Paulo Scott: contra a definição de uma obra literária como sendo melhor que outra
Paulo Scott: contra a definição de uma obra literária como sendo melhor que outra

Ano da Copa 2
Se há quem considere o “L” da questão maiúsculo demais para se misturar literatura com jogos sem premiação, o escritor Paulo Scott diz que aprecia a iniciativa do evento de promover a literatura e faz questão de receber críticas sobre o seu trabalho. Só não quis ver seu Habitante irreal no meio da disputa: “Não me sinto confortável com a lógica que defende uma obra literária, em ‘confronto direto’, como sendo melhor que a outra”, explicou, via Twitter. Apesar do seu pedido, a organização diz que o livro fica na disputa (contra Dentes negros, de André de Leones).

 

Fliporto 2013
A Festa Literária Internacional de Pernambuco anunciou os primeiros nomes de sua 9ª edição, que acontece de 14 a 17 de novembro, em Olinda. Entre os destaques estão o escritor argentino Andrés Neuman, o angolano Valter Hugo Mãe, o português Francisco José Viegas e os brasileiros Laurentino Gomes, Andrea del Fuego e Ronaldo Correia de Brito. Neste ano, o evento homenageia José Lins do Rego e tem como tema “A literatura é um jogo”. 

 

Chacal é um dos poetas entrevistados pela Rádio Batuta
Chacal é um dos poetas entrevistados pela Rádio Batuta

Para ouvir
Além das conversas com Zuca Sardan, Daniel Galera e Lila Azam Zanganeh gravadas durante a última Flip, a Rádio Batuta, do Instituto Moreira Salles, vem realizando boas entrevistas com poetas contemporâneos. Chacal , Bruna Beber e Ismar Tirelli Neto estão entre os autores que falaram sobre suas obras à poeta Alice Sant’Anna. Os programas podem ser conferidos no site radiobatuta.com.br.

Em tradução
O quinto número da Machado de Assis recebe até o dia 21 deste mês inscrições de obras já lançadas no Brasil com primeiros capítulos ou trechos traduzidos para o inglês ou para o espanhol. A nova edição da revista da FBN, que será lançada durante a Feira do Livro de Frankfurt 2013, também publicará, além de prosa e poesia, obras de não-ficção na área de humanidades (livro-reportagem, ensaio literário, ensaio de ciências sociais e ensaio histórico).

Rascunho