Acorda para o dia, camarada. Hoje pode te acontecer qualquer coisa de inimaginável. Qualquer coisa que vai te bagunçar as ideias para sempre. Uma notĂcia que, com o tempo, nĂŁo perderá seu teor explosivo, nĂŁo será substituĂda nem completamente assimilada, espantosa e estonteante prolongando vetores numa revolução hipercĂşbica.
A partir daĂ, atĂ© as coisas mais cotidianas vĂŁo confundir tua confiança. Senta um pouco, respira fundo, mesmo que as coisas pareçam ainda estar Ă tua espreita, respirando contigo, te observando. Mas o que foi que te aconteceu? Me conta. Que espĂ©cie de estranho evento pĂ´s outros olhos nos teus e veio enlouquecer teus sentidos, tua histĂłria, tua memĂłria, como se, do nada, no teu caminho se interpusesse uma grande asa? Me conta.
E se eu te dissesse que de fato já aconteceu com alguém, uma vez, isso de uma grande asa aparecer do nada? E a coisa inaudita desse fato é que não se tratava de asa de pássaro, muito menos de mariposa. Está certo que não é fácil recontar um fato desses portando junto sua ignição, seu susto de seta afogueada. Tem gente que se passasse por isso preferiria se despistar de si mesmo, barrar com uma risada o olho do assombro. Tem gente que não esqueceria nem se tentasse, embora nunca tocando no assunto, para assim o devolver, mesmo que superficialmente, ao nada.
Pode ser que falando assim, naturalmente, sobre esses inimagináveis, os que já estiveram ali se reconheçam como numa sociedade secreta dos assombrados. Mas, se isso ainda te soa simplesmente muito estranho, alĂ©m de risĂvel, se te parece ainda sĂł literatura, excĂŞntrico motivo de crĂ´nica, apoio com toda sinceridade teu bom senso, tua feliz tridimensionalidade, camarada. Defendo, atĂ© segunda ordem, teu bem-estar mental, que tambĂ©m já foi o meu, dias atrás.