Vou partir unicamente da minha observação das redes sociais. Facebook e Instagram, para ser mais precisa. Gritadas como vilãs na boca da maioria, preciso reconhecer que as redes foram e são um grande apoio para o meu trabalho. Joga-se ou não o jogo. Conhecemos pessoas que conhecem pessoas e como o próprio nome diz, uma rede de possibilidades se espalha. Dentro dessa teia, afetos, mas também desafetos, claro, é de se esperar.
Gostaria de, antes de passar pelo indizível entre as mulheres, elaborar um pouco sobre as amigas que fiz ao longo destes já velhos tempos virtuais. Algumas mulheres são absolutamente fascinantes e me sinto mesmo com sorte por tê-las por perto. Com muitas troco mensagens no WhatsApp, cartas (longuíssimos e-mails), marcamos encontros por vídeo e desabafamos através de áudios imensos que já são chamados de podcast. Ser amiga, mas amiga mesmo, de outras mulheres, foi algo que não me foi ensinado enquanto crescia. Pelo contrário, foi desencorajado.
Ao meu redor, muitas outras mulheres, mais velhas ou mais novas, tratavam-se como se competissem entre si. O pressuposto era não gostar para depois, com esforço, passar ou a gostar ou a conviver. Nesse formato de coexistir, as mulheres se olhavam desconfiadas, faziam críticas duras umas às outras, ainda que nunca tivessem tido a opinião pedida.
Dos ensinamentos que jorravam nas vidas das meninas que cresciam comigo, um dos mais nocivos era que amigas tinham inveja umas das outras. Mas inveja do quê? Naqueles tempos, podia ser de absolutamente tudo: dos cabelos, dos quadris, das famílias com dinheiro, das roupas, do carro, das viagens, dos namorados ou pretendentes.
Eu, por exemplo, passei dos 13 aos 20 anos usando maiô e nunca biquíni porque, um dia, duas amigas me disseram que meus peitos eram grandes demais e eu deveria escondê-los. Foi preciso um namorado, aos 19, me convencer do quão bonitos eram aqueles mesmos peitos que estavam guardados, reprovados por quem, eu imaginava, quisesse meu bem e minha autoestima nas alturas.
Claro, uma tremenda insegurança entre as meninas era nutrida e repetida, a norma. Para os mais velhos, as críticas eram ciúmes dos outros. Dessa forma, crescemos muitas de nós, desconfiadas das próprias amizades. É um círculo nauseantemente alimentado pelas próprias vítimas desse hábito.
Quando ouvimos que os homens são mais fáceis de lidar porque não têm esse tipo de rusga entre si, já sabemos que engolir o machismo goela abaixo significa alimentar a ridicularização das relações de amizade entre mulheres.
Com terapia e tempo, quase tudo pode ser entendido ou ressignificado, e eu não sou louca de recusar afeto. As redes, essas mesmas redes vilãs, me deram amigas que até estimular a minha autonomia, estimulam. Muitas nem têm qualquer vaga ideia do quanto me ajudaram. Das que concordaram em dar cursos que eu propus até as que me ofereceram remuneração através da minha escrita.
Quando disse a elas que estava me separando e que precisava de trabalho, elas me ouviram. Dividiram comigo oportunidades. Assim mesmo, de braços abertos e generosos, criaram maneiras de me ver trabalhando, produzindo, me disseram coisas bonitas e me encorajaram. Não me oferecem um pingo de julgamento quando explico a vida livre que levo, bem longe do que é convencional. Ao contrário: se interessam, querem saber, passam a refletir sobre.
Mas há também as que não chegam junto, ainda que se considerem feministas e parte de uma teia que deveria apoiar a próxima. Ainda há as que alimentam as distâncias e a competição, ainda que haja tentativa de aproximação e tanto em comum. Não me refiro ao direito de não gostar de alguém. Não. Todos nós temos mais ou menos simpatia por determinadas pessoas. Mas há casos de resistência.
Há mulheres que trabalham para mulheres das quais não gostam e, por isso, fazem pouco por elas. Mulheres que fecham os olhos bem fechados enquanto outra mulher ganha algum destaque no mesmo campo de trabalho porque daqui a pouco passa. Mulheres que sabem que outra poderia fazer um trabalho melhor do que elas próprias, mas não partilham. Mulheres que têm medo de passar vexame como a outra que posta uma foto gratuita nas redes, só porque se sente bem. Assim, seguram firme os dedos para que não compactuem daquele momento de vaidade através de um coração gratuitamente disponibilizado pelo Instagram.
Eu tenho uma filha adolescente e falar mal de amiga é algo que não tolero. Quando ela tinha 10 anos, ensaiou um ressentimento e foi a minha oportunidade para tentar fazer dela uma menina mais segura do que a que eu fui. Quando hoje levo essas jovens mulheres para comer fora ou para um passeio com a minha filha, noto a delicadeza e a alegria com que se tratam. São gentis umas com as outras e estão felizes porque estão juntas. São meninas que se dão conforto e força.
Para as minhas amigas geniais que leram este texto, saibam que vocês são, para mim, um céu de estrelas.