A internet tem de um tudo. O YouTube tem mais. Tudo se acha, mesmo sem qualidade, sem condição. De tudo existe um pouco. Tudo muito. Todo assunto, toda instrução, do it yourself, com ou sem ring light. Em palavra, imagem, som, vĂdeo e áudio, do jeito que for, de tudo há. Qualquer coisa fica fácil de achar. O filtro, se tiver, Ă© a gente que faz. Ou nem isso. E a prova de que tudo pode estar no YouTube, que desbancou lâmpadas de cristal e enciclopĂ©dias de trinta volumes, Ă© que procurei instruções tĂŁo dĂspares quanto sui generis, nos Ăşltimos tempos, e as soluções estavam sempre lá. AtĂ© quando alguĂ©m me dizia: ah, mas nĂŁo deve ter isso no YouTube. E eu dizia: quer ver sĂł?
Procuras Ăşteis
Há alguns anos, quando eu precisava tirar uma mancha da roupa, pelo de casaco, risco de disco ou lustrar um sapato, minha mĂŁe vinha com um livro ou dois e me dizia para ler a página tal. O livro nĂŁo tinha tudo, mas geralmente dava uma dica ou macete que quebrava bem o galho. Aliás, ainda tenho aqui, em algum lugar da estante, o Dicas, truques e quebra-galhos, assinado por Mary Ellen, publicado no Brasil pela Rio Gráfica em 1976. Sim, o manual era quase da minha idade, e minha mĂŁe o brandia sempre que algum desafio esquisito aparecia em casa. No subtĂtulo da obra lĂŞ-se: “maneiras fáceis, rápidas e divertidas de resolver problemas caseiros”. Existia tambĂ©m um volume dedicado ao ambiente da cozinha. (Procurem, que ainda se acha na Estante Virtual).
Herdei esse livro. NĂŁo sei quando. Veio junto com alguma estante trazida da casa dos meus pais. Logo, ele foi sendo posto nas prateleiras dos fundos ou de baixo, atĂ© desaparecer das minhas vistas. Sei que está aqui, em algum canto, e isso me dá segurança para viver a vida cotidiana. Mas meu material de apoio mesmo, hoje em dia, Ă© o YouTube. É nele que encontro as dicas, os truques, os quebra-galhos e as instruções para tudo, tambĂ©m de maneira divertida, geralmente tosca. Mesmo que eu ria rios enquanto assisto aos vĂdeos, logo passo Ă prática e a situação de fato se resolve. Vejamos.
Procura recente
Comprei um relĂłgio e despertador digital, a pilha, bem vagabundo, numa lojinha aqui do bairro. Achei caros os modelos de tomada, de boas marcas, e resolvi experimentar a tecnologia chinesa de Ăşltima (categoria) geração que o vendedor da birosca me oferecia. Nem tĂŁo barato. Na caixa, muitas promessas: mostra hora, minuto, segundo, dia, mĂŞs, temperatura ambiente. AcessĂvel: fala as horas de uma em uma. Que beleza. Nem precisava de tanto. Era sĂł ser relĂłgio e estaria bom. Levei.
Abri a caixa, nada de folheto de instrução. Tudo autoexplicativo. Made in China, era verdade. Pus pilhas (que nĂŁo vinham junto, estava avisado). Logo, os nĂşmeros quadrados apareceram no visor. SĂł dois botões para acertar tudo: hora, minuto, dia, mĂŞs. Começou meu pesadelo. Aperta, segura, solta, aperta junto, separado, dois segundos, meio milĂ©simo, solta correndo. Consegui. Tudo acertado. A temperatura, ele sacava sozinho. É confiar. Pus em cima da cabeceira e saĂ.
Quando voltei para casa, fui arranjar lanche, pôr água no filtro, lavar as mãos, não necessariamente nessa ordem. De repente, uma voz feminina bem alta, meio metálica e abafada, sem que eu pedisse e até me dando um sustinho, me informa as horas redondas: oito horas. E assim fez, incansavelmente, até as duas, três, quatro da matina. Como calar essa mulher, my god? Aperta botão, segura, firma, solta, trisca rapidinho, cutuca, nada. Atrapalhei as horas, os dias, os meses, e a mulher continuava pronta para dizer as horas eternamente, inclusive no meio da madrugada. Como resolver uma treta dessas, sem lançar o relógio novo pela janela? Ou sem tirar as pilhas, calando-o para sempre? A resposta estava bem diante de mim: o YouTube.
A solução, pois
É claro que nĂŁo foi assim tĂŁo fácil. O namorado, desesperançoso com a vida, duvidou: quem teria falado sobre um relĂłgio besta desses na internet? A resposta era Ăłbvia: alguĂ©m. Sempre tem alguĂ©m. Nunca estamos sĂłs. AlguĂ©m teve problema semelhante, alguĂ©m ficou sem dormir, alguĂ©m resolveu ajudar a humanidade, alguĂ©m se deu ao trabalho de gravar um vĂdeo e postar num canal uma informação utilĂssima sobre como emudecer uma voz infernal que fala as horas a intervalos regulares, dentro de um relĂłgio vagabundo.
Estava lá o cabra, com sua filmagem possĂvel, explicando para uma ávida audiĂŞncia assĂncrona como fazer aquela voz desaparecer. NĂŁo era mágica, nĂŁo era feitiçaria, era questĂŁo de segurar os botões na ordem certa e plim! O relĂłgio virou sĂł relĂłgio de ler. E assim fomos felizes em nossa noite de sono. Tudo porque o YouTube está aĂ. E as pessoas que querem ensinar qualquer coisa sempre estĂŁo por lá.
No prĂłximo texto, vou reunir uma pequena sĂ©rie de aprendizagens recentes sobre coisas nada a ver que estĂŁo no YouTube, coisas que eu quis fazer, ainda sem rumo, e que resolvi assistindo a trĂŞs ou quatro vĂdeos no YT, sem sair de casa, sem pagar nada e, nĂŁo raro, rindo pacas. Darei destaque ao amadorismo simpático de alguns vĂdeos, Ă boa vontade dos/as professores/as e ao resultado da minha façanha, depois de comprovar que as dicas e truques funcionam. Apertem o sininho, curtam o canal.