Para o paraense Edyr Augusto, a literatura tem a obrigação de “ensinar a refletir”. Não à toa, sua escrita — sangrenta, pesada — é um prato cheio àqueles que esperam catarse da ficção. Após transitar pelo teatro e pelos versos na juventude, o autor partiu para o romance e seguiu investindo na prosa. Ao ler Os éguas (1998), por exemplo, que marca a estreia de Edyr na narrativa de fôlego, o leitor não ficaria surpreso ao descobrir que Rubem Fonseca é uma de suas inspirações. Além de ter atuado como jornalista e professor, é autor, entre outros, de Pssica (2015), Selva concreta (2014) e Um sol para cada um (2008).
• Quando se deu conta de que queria ser escritor?
Escrevi uma peça de teatro aos 16 anos. Adiante, escrevi poemas marginais. Também crônicas para jornais. Outro dia, a vontade de escrever um romance. Não parei mais.
• Quais são suas manias e obsessões literárias?
Atuei como jornalista, publicitário e radialista. A vida diante de um teclado. Isso resultou em uma obsessão pela concisão, que hoje caracteriza minha literatura. Também deixo um livro maturar na cabeça, antes de começar a escrever. Nunca sei como será seu final.
• Que leitura é imprescindível no seu dia a dia?
Vários jornais. Alguns blogs. Mídia social. Além de estar bem informado, procuro histórias de vida interessantes, que possam me servir adiante, em algum livro.
• Se pudesse recomendar um livro ao presidente Jair Bolsonaro, qual seria?
Algum livro reunindo poemas de Fernando Pessoa. O presidente precisa, urgentemente um tempo para ler Pessoa e refletir sobre sua própria vida. Me parece alguém muito acossado por forças internas.
• Quais são as circunstâncias ideais para escrever?
Para um romance, um tema, alguns personagens interessantes e deixá-los viver. No dia a dia, a tarefa a ser cumprida no deadline.
• Quais são as circunstâncias ideais de leitura?
Um bom livro, que possa ser lido com prazer em qualquer circunstância, no silêncio ou no saguão de um aeroporto.
• O que considera um dia de trabalho produtivo?
Para um romance, o capítulo do dia escrito, relido, editado e aprovado. Tarefa cumprida, minha cabeça pensa em frente.
• O que lhe dá mais prazer no processo de escrita?
Uma vez, uma moça perguntou-me como conseguia dormir após escrever cenas tão fortes. Respondi que dormia muito bem e feliz, não pelos acontecimentos em si, mas por ter conseguido o melhor resultado possível, segundo meu julgamento.
• Qual o maior inimigo de um escritor?
A ânsia de repetir um sucesso, ao invés de apenas escrever para seu próprio juízo e submeter-se ao gosto do público. Há quem repita e tenha mais sucesso ainda, mas não quero isso para mim.
• O que mais lhe incomoda no meio literário?
O fato que nem o encolhimento das distâncias, trazido pelas comunicações, acabou com o esquecimento de muitos, de escritores que não moram no Centro-Oeste do país. Gostaria de ser convidado a participar de mais eventos literários.
• Um autor em quem se deveria prestar mais atenção.
Gosto de Marcelo Mirisola, Ronaldo Bressane e Marcelino Freire.
• Um livro imprescindível e um descartável.
O falcão maltês, de Dashiell Hammett. Não descarto livros. Alguém pode sempre gostar.
• Que defeito é capaz de destruir ou comprometer um livro?
As dez primeiras linhas são fundamentais. Após, as dez primeiras páginas. Se não fisgarem o leitor, é o fim.
• Que assunto nunca entraria em sua literatura?
Não saberia escrever ficção científica.
• Qual foi o canto mais inusitado de onde tirou inspiração?
Um prédio abandonado, no centro de minha cidade, esquecido, torna-se um concorrido e luxuoso cassino clandestino em meu próximo livro.
• Quando a inspiração não vem…
O suor trabalha para quando a inspiração chegar, corrigir e encaminhar melhor o que foi feito.
• Qual escritor — vivo ou morto — gostaria de convidar para um café?
Gostaria de conversar com Rubem Fonseca, uma de minhas influências.
• O que é um bom leitor?
O vulgar. Que lê de um tudo. Sou um leitor vulgar. Tudo me interessa, ou não. Mas começo a ler.
• O que te dá medo?
Livros e filmes de terror.
• O que te faz feliz?
Um capítulo bem escrito. Escrever para a editora Boitempo.
• Qual dúvida ou certeza guiam seu trabalho?
Quando apresento um trabalho, tenho certeza que é o meu melhor. No entanto, a dúvida se agradará, sempre existirá.
• Qual a sua maior preocupação ao escrever?
Quero ser conciso e, ao mesmo tempo, dizer tudo. Quero poder entrar no mais profundo da alma dos personagens e a revelar.
• A literatura tem alguma obrigação?
Ensinar a refletir.
• Qual o limite da ficção?
Mirisola disse que os ficcionistas precisam ter cuidado, pois a realidade se tornou uma concorrente.
• Se um ET aparecesse na sua frente e pedisse “leve-me ao seu líder”, a quem você o levaria?
Não levaria. Grande risco.
• O que você espera da eternidade?
Que, de algum lugar, possa, de alguma forma, proteger meus filhos, meus queridos, minha família. Ou será escuridão? Não existência?