1
Instalar uma imagem
no ápice
de outra imagem
é uma definição
de haikai
ou de monumento
quando escalado pela multidão
nos dias em que sonhamos
o futuro.
2
Nunca sei se haverá tempo
de alcançar a porta aberta
quando o sinal sonoro
anuncia vai partir —
ao sul? ao norte? quem sabe o destino
da composição eternamente lotada?
Todos os metropolitanos
sincronizados
sem rumo. Lá no alto
na superfície
nas Praças
do mundo
a qualquer instante —
centelhas
sem norte? sem oriente?
ao sul
do futuro? onde a fagulha
agora?
3
Na escadaria do Theatro, a multidão
ergue uma criança ao alto
tão alto quanto o mais alto dos monumentos
iluminados apenas nos instantes de esperança.
Na pág. 275, da Descoberta
do mundo, Clarice diz “ter tocado
o monumento mais alto”, mais alto ainda
porque é lembrança.
4
À noite
aos pés do monumento
eles são legião.
Não aparecem
não se tornam
imagem
se não
como matéria opaca
subtraída —
nada mais invisível
do que um monumento
— disse Musil.
5
Turista
passante
ou morador de rua
ninguém
vê Floriano
lá no alto —
na segunda-feira de maio
atravesso a Praça
e me torno turista
nas fotos que faço
na selfie
descartável
sob o sol estático
da única estação
que nos cabe.
6
Subo os degraus que levam
à Construção do Reino
do Brasil e não sei bem
quem segue a meu lado
os pipoqueiros? os estudantes?
os-que-vivem-sobre-os-bancos?
subimos aos saltos
às cegas aos tropeções empurrados
sobre camadas emperradas
de tempo.
7
Nunca vi madrugada alta
na Cinelândia
mas assisti ao desígnio
de uma nova rua
com nome de mulher.
8
Desde aquele domingo de outubro
vejo a menina
no exato instante em que se eleva
sobre a pedra e o bronze
em aceno: contra-monumento
à derrota.