Alta ansiedade

Leitores ansiosos querem o livro antes do lançamento, mas o livreiro defende a espera, o diálogo e a descoberta de novas leituras sem pressa
Ilustração: Italo Amatti
30/08/2025

O título desta crônica me remete ao filme de comédia dirigido pelo brilhante Mel Brooks, e o humor é o meu impulso predileto. É a forma como vejo e reflito sobre um problema e, muitas vezes, o humor me dá o respiro quando não dá um caminho suave. Sim, me lembrei da cartilha Caminho suave. Imaginou existir uma cartilha que nos ensinasse a ler e a ter senso de humor?

Quero trazer para esta mesa, para este encontro imaginário entre nós, algo que tem acontecido desde sempre, mas tem sido cada vez mais intenso. E, nesses dias, houve um exemplo que me fez parar tudo e teclar estas linhas. Usei a imagem de mesa e encontro porque, em muitos momentos, recebo retornos de leitores das crônicas que dizem se sentirem num encontro comigo quando leem os textos. Então, puxem uma cadeira e seguimos a prosa, sem pressa.

Toda visita é uma boa notícia numa livraria. Os livros bagunçados, fora de lugar, demonstram que por ali passaram leitores e, sempre que vejo a livraria mexida, confesso que gosto, que fico otimista sobre o dia que viveremos por entre livros. Livraria arrumada demais, calma demais, organizada demais traz uma atmosfera mais cerimoniosa. O caos me faz bem. As bibliotecas merecem e sugerem mais organização; as livrarias sugerem menos rigor e mais diversão.

E, numa dessas visitas, o cliente vai direto ao caixa e pergunta sobre um novo livro daquele autor que vende muito no planeta, o Dan Brown. Dentre seus livros, o de mais sucesso foi o Código Da Vinci, que nunca li. Os críticos alertaram para os problemas de situações fora de ordem cronológica, erros temporais cometidos pelo autor, que tendo a relevar, pensando a obra como um texto de ficção. Mas, claro, perde credibilidade. Penso aqui com meus botões de época, dourados em minha casaca. E, pensando em situações temporais deslocadas da realidade, o nosso querido leitor pede, sem mais delongas, o novo livro do Mr. Brown e, ao pesquisarmos, vemos que a obra será lançada só em três semanas.

Quando repetimos a informação, o ansioso cliente responde: “Eu já sabia, mas mesmo assim queria ver se, por acaso, já não tinham recebido.” Coço a cabeça e puxo meus suspensórios (estou vivendo no passado, como num romance do Mr. Brown). Está aí um exemplo de lapso temporal vivido não só pelo autor, mas também pelos seus leitores. Ora, se até no portal da editora a obra só chegará em quase um mês, como já teria disponível numa pequena livraria em Santos? Pensando assim, até é bonito: uma tentativa de um leitor fiel e ansioso pela sua próxima leitura buscar e pedir a obra. Mas algo em sua expressão dizia que ele já imaginava que não teríamos o livro. Que sinergia entre leitor e obra, pensei comigo, enquanto molhava a pena em um tinteiro.

Tudo isso me faz pensar no tempo e na velocidade. Leitores querem os livros antes de existirem e, quando pedem algo que podemos encomendar, a resposta mais comum é: “Puxa, queria pra agora.”

Precisamos chegar a um meio-termo. A minha modesta sugestão é a de se criar laços com as livrarias, de se construir essas relações de uma pequena espera e que, nesse meio tempo, os livreiros sugiram opções para seus clientes — opções nascidas da conversa iniciada no balcão, sugestões sem pressa, bibliografias, livros livres do famigerado algoritmo das ponto com, essas empresas que querem acelerar o tempo e tirar, de alguma forma, o nosso prazer em conversar, sugerir e nos aproximar: nós, os livreiros, de vocês, os leitores.

Visitem as livrarias sem pressa e com curiosidade. Vai valer a pena. O livreiro garante.

José Luiz Tahan

É livreiro, editor e idealizador do festival Tarrafa Literária. Autor da antologia de crônicas Um intrépido livreiro nos trópicos (Vento Leste).

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