Depois de um longo inverno sem um felino para chamar de meu, adotei dois gatinhos. Frederico e Verônica. São irmãos. Para a surpresa de ninguém, a doce Nina Simone os trata muito bem, com direito até a lambidas e beijinhos de nariz.
Assim como é bastante comum em machos de várias espécies, Frederico é destemido e burro. Minha mãe dizia que gato era bom porque já vinha pronto. Não sei, não. Acho que ela conviveu com gatos mais inteligentes do que eu.
Verônica ainda está tímida e não sabemos sua personalidade completamente, mas, até o presente momento, parece ser tão doce quanto Nina. Não sendo o enredo de Ilana Casoy e Raphael Montes (Andrea Killmore), para mim já está ótimo. Ontem, dormiram ambas no meu colo e, por muito pouco, não optei por perder o emprego do que levantar e ir trabalhar.
Fazia tempo que não tinha gato em casa e, apesar de agora saber que minha casa jamais voltará a ficar arrumada, estou adorando tudo.
A minha metodologia para adoção é sempre a mais passiva possível. Vou ao lugar de adoção e espero para ver qual bichano se aproxima. Deixo que o bicho me escolha, não o contrário. Eu tinha a intenção de adotar apenas um, mas, nas quatro vezes em que me aproximei, os mesmos dois pediram colo. Portanto, cá estão, rapidamente aprendendo o que derrubar no chão e qual o melhor ponto inicial para escalar a cortina.
No momento, trabalho com Verônica no colo. Tentamos, ela e eu, pela quinquilhonésima-quarta vez, emitir a Carteira Nacional Docente, a CNDB. Se seguirmos nesse ritmo, me aposento antes. Sempre me impressiona como os sistemas / sites governamentais são ruins. Não existe — eu repito, não existe — nada com uma interface pior e mais ineficiente que o Lattes. Tenho cá para mim que muitos professores desistem da profissão por causa disso. Não são os baixos salários, os ambientes muitas vezes tóxicos, os horários insanos, os pais dos lírios dourados, o ChatGPT, não. São esses sites que mais parecem parte de um grande experimento psicológico sobre indução de estresse e loucura. É muita ineficiência junta, senhor amado.
Tal qual prisioneiro em uma cela, estou fazendo marquinhas metafóricas na parede, contando os dias para o recesso de Natal. Nos aguarda uma longa lista de filmes a ver. Se eu puder escolher, não saio de casa para nada além de parque com Nina.
Verônica não liga quando me mexo um pouco ao digitar e continua a ronronar. Frederico entende que o travesseiro humano tem mais é que ficar quieto e cumprir sua função. Insatisfeito com a minha performance, vai procurar o que fazer. Nina dorme do nosso lado.
Levanto, pois boletos.
Já era difícil sair de casa só com Nina Simone.
Agora, está me parecendo uma tarefa impossível.
Para quem eu estou mentindo? Nunca fui muito fã desse negócio de sair de casa, não. Dá trabalho, precisa colocar uma roupa decente e tem pessoas lá fora.
Frederico não está nem aí. Um macho típico.
Verônica me olha sem entender.
Nina entende tudo. Suspira e volta a dormir.
Acho que nunca tive tanto sono na vida.