Escrevo essa crônica no dia 14 de agosto, uma segunda chuvosa aqui em São Paulo. Chega a notícia da corrida presidencial argentina, colocando o Javier Milei em uma posição muito favorável. Entre outros absurdos, ele afirmou que a justiça social é uma “aberração”. Confesso que não sei direito o que é anarcocapitalismo e fiquei com uma imensa má vontade para pesquisar. De uma forma geral, se nosso ex-presidente apoia, eu sou contra. No detalhe, a ideia de um capitalismo sem qualquer tipo de regulação me parece uma mistura entre a inocência e o perigo.
O sujeito é a favor da venda de órgãos humanos, liberação de armas, um país sem Banco Central, defende a privatização dos sistemas de saúde e educação, chamou as mudanças climáticas de “farsas da esquerda”, classifica a educação sexual como uma manobra para destruir a família e, claro, é contra o aborto (legalizado na Argentina em 2020).
Sobre venda de crianças:
Um jornalista perguntou se ele aderia à “venda de crianças” também. “Depende”, respondeu Milei. “A resposta não seria não?”, perguntou-lhe o jornalista. “Se eu tivesse um filho, não o venderia”, disse ele. “A resposta depende de quais termos você está pensando, talvez daqui a 200 anos isso possa ser debatido.” (O Globo)
A única face legal que vi até agora é o seu amor pelos doguinhos. Talvez até demais. Segundo o próprio, ele se comunica telepaticamente com o mais velho de seus cachorros, morto em 2017, a quem pede conselhos.
Como se não fosse suficiente, decide em quem pode ou não confiar a partir da leitura de tarô da irmã Karina, que é, também, sua chefe de campanha.
Durante o tempo em que esteve deputado, não promoveu nenhum projeto. Qualquer semelhança é mera coincidência.
Preciso dizer que é misógino? Não, né? Não preciso.
Não faço parte desse bairrismo ridículo. Sou do time Mi Buenos Aires querido. País maravilhoso, com pessoas incríveis. Não atiro a primeira pedra. Às vezes nós também votamos muito mal.
Momentos como esse, em que um Milei-Bolsonaro da vida tem tanta voz assim, me assustam. Tento me afundar nas artes, na literatura, na música e no universo canino. Nem sempre dá certo.
Leio Veado assassino, do Santiago Nazarian, com gosto. Sim, os assuntos são relacionados. Sou leitora do Nazarian tem tempos. Li com particular interesse não apenas pela qualidade literária, que já seria motivo suficiente, mas também pelo fato de ser um grande diálogo. Estou, quero crer, terminando meu primeiro romance que, assim como o Veado, também é um desencadeamento de diálogos. É bom descobrir como autores que admiramos resolveram a questão que enfrentamos.
É muito difícil fazer coisas parecidas com pai ou mãe. A comparação é inevitável e, nesse quesito, eu saio perdendo de largada. Acabei me afastando um pouco, por ter entrado na Academia e ido para a História da Arte. A tecnologia também ajuda. A minha pesquisa com grafos relacionais me diferencia bastante da minha mãe. Ainda assim, a sombra existe. Quero acreditar que a fruta não cai muito longe da árvore. Esperança é a última que morre. Veremos.