Itapuã, São Paulo

A busca por uma galeria de arte que aceite a entrada de cachorros e a possibilidade do fim do mundo no meio do caminho
Ilustração: Bruno Schier
21/09/2023

Procurar galeria para exposições é um trabalho engraçado. Encontramos desde a galerista que te atende sem sapatos estilo namastê até aquela de tailleur, salto alto e laquê no cabelo. E tudo no meio. Eu acho divertido.

Trânsito dos infernos. Todos — todos — os semáforos quebrados no meu caminho, ida e volta. O ar condicionado do carro torna a existência possível e o Spotify a torna agradável. Toca uma das minhas músicas favoritas e eu começo a cantarolar, aproveitando a ausência de testemunhas. O motorista do carro ao lado, estressado no último, de péssimo humor, visivelmente transtornado e provavelmente atrasado, me olha com raiva. Eu não ligo. A raiva é dele, não minha, que fique com ela. Na porta de casa, uma pessoa atropelada no chão. Primeiro ligo para filho, sem nem raciocinar direito. Depois descubro que é um motoqueiro. Esse negócio de trânsito não deu certo, gente. Devolve pros índios.

Estou desde 26 de agosto brigando com o (des)serviço que (não) fornece internet. Chego em casa, adivinhem, sem internet. E o vizinho de cima está fazendo obra. Desisto e saio com Nina Simone.

Levo Nina a uma das galerias que preciso visitar. Vai ser, doravante, a nota de corte: se entra ou não cachorro.

Na galeria bicho-grilo-gente-esquisita, entra. Gosto dela. É pequena, não tem muita infraestrutura mas também não tem muita encheção de saco. Eu gosto da troca. Aceito e fecho negócio.

Nina, como sempre, me dá sorte.

Nina e eu, únicos seres de bom humor em um raio de cinco quilômetros, decidimos tomar um café no caminho de volta.

De uma maneira muito aleatória, uma senhora começa a falar comigo sobre o mundo estar acabando. Aparentemente, os semáforos não funcionarem é o primeiro sinal. Acenei com a cabeça e ela foi embora. Comento com Nina que eu achava que o calor seria o primeiro sinal do fim do mundo. Nina acha que é a quantidade de pombos na rua. Suspeito de que exista uma ligação entre os três.

O motoqueiro está em pé gritando com alguém. Isso me tranquiliza. Para gritar com as pessoas é necessário estar relativamente bem das pernas e com os pulmões funcionando.

A moça descalça da galeria me liga. Esqueceu de dizer que eu posso furar parede, se precisar. Agradeço. Vou precisar. A moça trabalha em outro ritmo. Ela mora em São Paulo mas vive em Salvador, me parece.

Nina e eu gostamos dela.

Carolina Vigna

É escritora, ilustradora e professora. Mais em http://carolina.vigna.com.br/

Rascunho