Tenho uma amiga jovem, linda, que se diz amante do ofício da escrita. E o pratica com a mesmíssima paixão com que treina em academias, ruas e esteiras. No entanto, não se trata de uma atividade esportiva comum, daquelas que visam manter a saúde ou afugentar a protuberância abdominal. O que ela realiza é uma espécie de culto, uma devoção muscular que parece ter sido tirada de um livro de autoajuda escrito pelo Arnold Schwarzenegger.
Se fosse apenas uma questão de saudabilidade, eu aplaudiria de pé. Afinal, quem sou eu para criticar o desejo de um metabolismo mais eficiente? Mas o que vejo é muito além: um completo fanatismo muscular, um compromisso diário com a exaustão, uma busca religiosa pelo supino perfeito. É uma academia sem fim, onde o altar é a esteira, a hóstia são barrinhas proteicas e a comunhão se dá ao som de “no pain, no gain!”
Não sou psicólogo, mas, para mim, a obsessão pelo fitness atingiu as raias da loucura no século 21. Nossos ancestrais corriam porque precisavam caçar, fugir de predadores e de hecatombes. Hoje, corre-se para caber no jeans. E essa minha amiga escritora, que deveria estar imersa em Dostoiévski e Virginia Woolf, está afundada em whey protein, abdominais e alongamentos.
Vejo as fotos dela nas redes sociais: selfies suadas, vídeos de agachamento, maratonas sob o sol causticante. E me pergunto: a que horas ela lê? Quando anota suas fantasias? Como pode, entre uma passada e outra, encontrar tempo para refletir sobre a angústia humana? Fico imaginando seus futuros livros: protagonistas com trapézios definidos, antagonistas com baixos níveis de creatina e outros seres atléticos.
Se Hemingway vivesse nos dias de hoje, provavelmente teria trocado a pesca esportiva, ou o boxe, por um personal trainer e uma assinatura premium da Smart Fit. Kafka teria se transformado literariamente, não em um artista de saúde frágil, mas em um crossfiteiro. Já Machado de Assis, talvez desistisse de narrar a alma humana e passasse a relatar os benefícios das práticas aeróbicas para a saúde cardiovascular.
Eu, pobre mortal sedentário, continuo acreditando que a verdadeira malhação acontece entre as páginas dos livros e os parágrafos escritos com suor filosófico, não em salas de espelhos onde todos se observam como Narcisos. Mas quem sou eu para dizer alguma coisa? Talvez eu devesse me render e fazer algumas flexões enquanto penso em minha próxima crônica. Isso se meus braços, atrofiados pela literatura, ainda suportassem.