Assim como Hogwarts, o Instituto Mágico de Vorónezh também tinha seus corredores escuros e lendas próprias. Não havia quadros de bruxos nas paredes, mas murais coletivos retratando as assembleias de operários. Para sair de uma sala para outra, o aluno precisava apresentar uma moção, devidamente aprovada por maioria simples, o que fazia com que as mudanças de classe demorassem, em média, quarenta minutos a mais do que o normal.
Os fantasmas, por sua vez, não eram cavaleiros decapitados nem damas chorosas. O mais popular deles atendia pelo apelido de Camarada Transparente. Tinha sido, em vida, um zelador de alto escalão que acreditou tanto no plano quinquenal que acabou ficando preso a ele eternamente. Vagava pelos corredores com pranchetas e gráficos etéreos, convocando reuniões às três da manhã para discutir a produção de caldeirões.
O quadribol, claro, não resistiu às adaptações soviéticas. Em vez de vassouras, usavam-se foices e martelos que soltavam fumaça de gelo seco siberiano para dar dramaticidade. As partidas terminavam sempre empatadas, pois qualquer diferença no placar era corrigida no ato pela comissão reguladora de igualdade social-desportiva. Quanto ao pomo de ouro, havia sido substituído por uma marmita de aço inox, disputada com uma ferocidade digna das filas do refeitório.
A biblioteca Madame Pince não existia na versão URSS. No lugar dela, uma senhora chamada Ludmila Ivánovna controlava as estantes como quem administra uma cooperativa agrícola: nada de livros individuais, apenas coletâneas conjuntas. “Um feitiço só tem valor”, dizia ela, “quando todos escrevem juntos o encantamento”. Assim, se um aluno queria pesquisar sobre dragões, precisava esperar que os outros votassem se também estavam interessados naqueles animais durante o semestre.
E havia os banquetes. Nada de mesas cheias de peru, tortas e chá gelado em taças, mas grandes panelões de sopa comunitária, sempre de beterraba. O sabor variava conforme a interpretação dos cozinheiros, mas a cor permanecia fiel ao espírito ideológico.
Professor Leonid era a alma do lugar. Sua didática não consistia em levantar a voz ou lançar feitiços luminosos, mas em repetir calmamente, com um meio-sorriso sob a barba: “A magia verdadeira é fazer o rico assinar um cheque em branco acreditando que está contribuindo para um baile”. Os alunos anotavam e depois praticavam nos corredores: confiscavam o chocolate do colega filhinho de ministro e o redistribuíam em partes iguais para toda a turma.
No fundo, Vorónezh não era uma escola de magia qualquer. Era um instituto de truques sociais, de ilusionismo econômico, de encantamentos burocráticos. Uma escola em que a poção mais poderosa não era a do amor, mas a do orçamento participativo.
E talvez fosse essa a maior diferença entre Hogwarts e sua filial comunista: na Inglaterra, aprendia-se a derrotar monstros; na União Soviética, a domá-los por meio de impostos e redistribuições, até que eles mesmos, sem uma alternativa, aceitassem o exílio na Sibéria.