Limbo (Caos & Letras), de Eduardo Sabino, traz um conjunto consistente de contos, mantendo o bom nível da produção anterior do escritor mineiro. Contos com pegada de crônica, como O pracinha e Antônio Barbeiro; contos cômicos, como Querida, que tem como protagonista um travesti que quebra a austeridade de um velório; contos fantásticos, como A cidade do tempo estagnado, cujo tema principal, como indica o próprio título, é o tempo — trata de um lugar onde o tempo paralisou para os velhos e em que uma cápsula misteriosa pode conter o enigma que envolve os velhos que nunca adoecem; contos de técnica depurada, como As metamorfoses, que faz um intertexto com Kafka e que é narrado do ponto de vista dos objetos de uma casa; contos bíblicos, como O Gênesis segundo um andarilho e O evangelho segundo Dow Jones. Mas o conto que mais me chamou a atenção é o primeiro do livro: O morto. Conto com todos os elementos do conto bem realizado: compactação, poder de sugestão e ponto de vista narrativa ajustado. A história é narrada por um menino que vai ao enterro do pai que ele nunca tinha visto e que a mãe dizia não existir. Um pai que já construíra uma outra família — a nova esposa é intempestiva, virulenta. Tudo narrado com precisão cirúrgica, deixando para o leitor uma enorme carga de significados acerca dos relacionamentos dificílimos entre o pai e suas mulheres, entre a mãe e a nova esposa do pai, entre o pai e o filho e ainda deste último com a mãe. Todo um conflito familiar compactado numa página e meia de uma narrativa singularíssima.