O operário em construção, de Vinicius de Moraes, é um exemplo de poema no qual há, de forma equilibrada, eficiente, o engajamento social e o estético. Certas palavras e versos, bem posicionados nas catorze estrofes, constituem os campos de sentido (que aqui podem ser tomados como pontos/argumentos) mais relevantes do texto. Vejamos quais são eles: 1) A tentação do patrão: o poema traz como epígrafe uma passagem de Lucas, cap. IV, versículos 5-8, na qual, por poder e adoração, Jesus é tentado pelo Diabo. Na 11ª estrofe, o burguês tenta o operário nos mesmos termos da proposta do Diabo a Jesus: “E num momento de tempo/ Mostrou-lhe toda a região/ E apontando-a ao operário/ Fez-lhe esta declaração:/ — Dar-te-ei todo esse poder/ E a sua satisfação/ Porque a mim me foi entregue/ E dou-o a quem bem quiser./ Dou-te tempo de lazer/ Dou-te tempo de mulher./ Portanto, tudo o que vês/ Será teu se me adorares/ E, ainda mais, se abandonares/ O que te faz dizer não”. 2) Mãos e mente (1): “Era ele [o operário] que erguia casas/ Onde antes só havia chão./ Como um pássaro sem asas/ Ele subia com as casas/ Que lhe brotavam da mão./ Mas tudo desconhecia/ De sua grande missão”. Aí, seguramente, casas que brotam da mão é uma imagem plástica, potente. Nela o verbo brotar (ter origem) fixa um campo de sentido fundamental do poema — aquele que remete às mãos como construtoras de objetos úteis à sociedade. No trecho, o verbo desconhecer (ignorar), introduzindo um outro campo de sentido forte do texto, dirige-se à mente — à falta de consciência de classe do operário, de seu papel na vida social. Mãos e mente, assim, se constituirão como os campos de sentido principais do poema. 3) Mãos e mente (2): a expressão “operário em construção” pode ser lida: 1) no sentido literal (o operário como o “indivíduo que, sob ordens de outrem e mediante salário, exerce um trabalho, especialmente manual ou mecânico” — Dic. Oxford Languages); e 2) no sentido figurado — o indivíduo cuja consciência está se edificando; ou seja, “em construção” estão também as ideias do operário, no sentido de ele passar a deslindar melhor a realidade, a ter maior consciência de classe. Confirma-se, portanto: mãos e mente é que agilizam, é que promovem a construção do operário.