Modernismo de 20 (2)

Como as vanguardas propõem uma forte tensão entre a tradição e o moderno
01/09/2022

Prosseguindo com os elementos que caracterizam as vanguardas europeias, temos: d) Cubismo: surge primeiro na pintura, em quadros com delineamentos geométricos, como Les demoiselles d’Avignon (1907), de Picasso. Na literatura, o manifesto lançado em Paris por Guillaume Apollinaire é de 1913. Nesse manifesto podem ser destacadas as seguintes propostas: no âmbito da destruição de elementos da literatura passadista — a) supressão “da cópia em arte, das sintaxes já condenadas pelo uso em todas as línguas, do adjetivo, da pontuação, da harmonia tipográfica, […] do sublime artístico, do verso e da estrofe, […] da intriga nas narrativas, do tédio”; no âmbito da construção em cima do passado — a) “literatura pura Palavras em liberdade Invenção de palavras, […] criação invenção profecia, descrição onomatopéica, maquinismo Torre Eiffel Brooklin e arranha-céus, poliglotismo, civilização pura, antigraça […]” e) Dadaísmo: teve como líder Tristan Tzara e foi lançado em Zurique, na Suiça, em 1916. O Manifesto Dadá é de 1918. Entre as vanguardas, é a mais implacável no que diz respeito à destruição do passado literário. O Dadaísmo pouco ou nada propõe no campo da construção — “Dadá não significa nada” são palavras de Tzara. Nonsense, ludismo, casualidade, improvisação, humor — são alguns dos elementos em que essa vanguarda investe. Em sua famosa “receita de poema”, Tzara ensina como montar um poema a partir de palavras recortadas de um jornal, postas em um saco e, na sequência, alinhadas aleatoriamente; f) Surrealismo: foi lançado oficialmente em 1924, em Paris, e teve como líder André Breton. Esse manifesto teve marcada influência de Freud. “Os surrealistas pretendem ser, mais do que uma escola, um meio de conhecimento e estudo aprofundado de conteúdos ainda não explorados pelos que os antecederam: o inconsciente, o maravilhoso, o sonho, a loucura, os estados alucinatórios, enfim, tudo o que é inverso à tradição da lógica e da racionalidade” (cf. Lúcia Helena — Modernismo brasileiro e vanguarda europeia). Daí o traço mais importante do movimento — o automatismo psíquico (que proporciona a escrita automática, um modo de escrever o que vem de fontes inconscientes). Em 1930, é lançado um segundo manifesto surrealista, desta vez influenciado por ideias de Marx. É um manifesto de viés político, doutrinário. Neste momento a questão colocada pelos surrealistas, diante de um mundo em crise, será — “qual a revolução a fazer — política ou literária?” (cf. Lúcia Helena, idem). OBS: O que há em comum entre todas as vanguardas históricas, além do caráter de renovação, do combate às formas e valores da literatura/arte passadista, é estabelecer uma crise de representação (na pintura esse aspecto é mais evidente com o combate ao figurativo, à imitação/cópia do real). As vanguardas estipulam, assim, uma tensão forte entre a tradição (notadamente a que vem do século 19) x o moderno, no sentido mais exato de modernista (expressão da arte renovadora que irrompe e é difundida, a partir da Europa, no início do século 20).

Rinaldo de Fernandes

É escritor e professor de literatura da Universidade Federal da Paraíba. Autor de O perfume de Roberta, entre outros.

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