O pungente Suíte de silêncios (Rocco), romance de estréia da paraibana Marilia Arnaud, tem como centro de sua narrativa os registros da tristeza e da angústia extrema da protagonista Duína, moldados num bloco (quase) monolítico, numa espécie de monólogo interior contínuo, em que o passado irrompe como um pesadelo do qual a personagem não escapa nunca, obsessiva em suas lembranças infelizes. Narrativa forte, opressiva, que desestabiliza e desconforta o leitor. Antes de ser um romance de amor, é um romance de dor e morte. Duína, em seus últimos dias, conta a sua história na forma de um depoimento (ou de uma longa carta) ao grande amor de sua vida — João Antonio, um médico que a abandonou ao optar por outra (a sua verdadeira mulher). Outro fato marcante da vida de Duína é o abandono da mãe, que, a protagonista ainda criança, fugiu com outro homem (a cena em que mãe e filha estão no cinema e o estranho homem, que usa “sapatos brancos”, aparece para ficar junto delas, desencadeando um ciúme mordaz na filha, é irretocável). Duína fica com o pai (o maestro Gaspar) e a avó Quela, que será, ao seu modo, um centro, uma referência para a sua formação. Assim, o abandono é o prato de que, desde criança, a protagonista se serve. O romance de Marilia se insere na tradição da narrativa urbano-existencialista, de que Clarice Lispector se fez mestre. A narrativa de Duína é, de fato, fortemente existencialista. A protagonista é toda dilaceramento.
CONTINUA NA PRÓXIMA EDIÇÃO.