Passo a comentar, nesta e em outras colunas, romances que tematizaram a Guerra de Canudos. Utilizarei-me, para tanto, do livro Canudos — conflitos além da guerra: entre o multiperscpectivismo de Vargas Llosa (1981) e a mediação de Aleilton Fonseca (2009), de Adenilson de Barros de Albuquerque e Gilmei Francisco Fleck, publicado em 2015 em Curitiba, pela editora CRV. O livro é um bom exemplo de pesquisa acadêmica que consegue atrair o leitor tanto pela clareza e fluidez da escrita como pelo teor. No caso, o teor diz respeito à Guerra de Canudos e a uma série de romances, de autores brasileiros e estrangeiros, que se compuseram em torno do conflito de 1897 no nordeste da Bahia, cuja narrativa e interpretação clássicas constam de Os sertões (1902), de Euclides da Cunha. Antes de abordar mais detidamente A guerra do fim do mundo, de Vargas Llosa, e O pêndulo de Euclides, de Aleilton Fonseca, os autores, num capítulo informativo, bem pesquisado, reexaminam um conjunto de romances que também enfocaram, e sob vários pontos de vista, a Guerra de Canudos. Nesse reexame dos romances históricos sobre Canudos são comentadas seis obras. A primeira é Os jagunços, de 1898, de Afonso Arinos (o romance foi publicado sob o pseudônimo de Olívio de Barros). Nesta narrativa, ainda com claras caracteríscas do romance histórico romântico, informam os autores, “conjugam-se elementos ficcionais com a apresentação dos recentes eventos relacionados à Guerra de Canudos (1896-1897)”. Informam ainda: “Escrito sob encomenda do jornal O Comércio de São Paulo, do qual Arinos era editor desde o final de 1896, o romance teve uma tiragem muito pequena, sendo reeditado somente em 1969, na Obra completa de Afonso Arinos”. Os autores acrescentam que o jornal O Comércio de São Paulo fazia oposição à recém-criada República — posição, portanto, “compartilhada” por Arinos [nota que julgo importante: Helmut Feldmann, no artigo O romance Os jagunços, de Afonso Arinos, recriado por Mário Vargas Llosa em La guerra del fin del mundo, mostra que o livro de Arinos — que, no ano da Guerra de Canudos, escreveu crônicas no O Comércio de São Paulo “glorificando” o Segundo Reinado, considerado pelo cronista “a era de ouro” do Brasil — influenciou fortemente Vargas Llosa, tendo importância capital para Llosa configurar o narrador de A guerra do fim do mundo, ou seja, um narrador que toma Conselheiro como “fanático e demente” e, por extensão, os jagunços conselheiristas como “verdadeiros monstros humanos”, por uma retórica que privilegia a hipérbole, tornando-os — tanto os jagunços como o Conselheiro — caricatos ao extremo].