Anotações sobre romances (18)

Em Os dias roubados, de Carlos Vazconcelos, fica-se sabendo que a condenação do protagonista se deu por “ações” de um deputado sórdido
05/02/2015

Em Os dias roubados, de Carlos Vazconcelos, fica-se sabendo que a condenação do protagonista se deu por “ações” de um deputado sórdido, pai de Águida: “Mostrou-me a foto de jornal. Era o deputado Jairo Filgueira, pai de Águida. Eu já sabia que a família me odiava e que havia trabalhado incansavelmente pela minha prisão, mas não conhecia os detalhes sórdidos da empreitada, os atalhos, as manobras, a compra de todos os envolvidos para minha condenação logo a partir dos primeiros indícios”. Um jovem promotor é quem “investiga a falsa sentença” e consegue retirar o protagonista da prisão. O romance de Carlos Vazconcelos é agudo na temática e bem elaborado na forma, com uma técnica inventiva. No final é que é revelado, por meio de um “posfácio” produzido por um dos organizadores do volume, que a narrativa que lemos (fragmentada, e o recurso soa perfeito, por conta do arranjo que foi possível ser montado pelos organizadores do material recolhido) se trata na verdade da autobiografia do protagonista, que, na prisão, e fazendo de tudo para preservar seus papéis, seus manuscritos, tornara-se escritor. Tornara-se escritor para denunciar a injustiça que o fez padecer durante quinze anos — e que, liberto, não o recompôs como indivíduo, fraturou de vez sua identidade. Carlos Vazconcelos, que tem mestrado em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Ceará e produz e apresenta um evento literário no SESC-CE, se inicia muito bem no romance.

Rinaldo de Fernandes

É escritor e professor de literatura da Universidade Federal da Paraíba. Autor de O perfume de Roberta, entre outros.

Rascunho