Continuando a leitura de Cândido Neves, do conto Pai contra mãe, de Machado de Assis. Aumenta a dificuldade financeira do personagem por conta da concorrência. E Cândido Neves é inapto para outros ofícios que não o de caçar escravos: “Não achava à mão negócio que aprendesse depressa”. E mais: a “cegueira da necessidade” o faz capturar escravos errados. E aí surge a esperança de uma saída: a escrava fugida Arminda, cuja recompensa pela captura é de cem mil-réis. Neste passo Cândido Neves torna-se um personagem denso, cresce humanamente aos olhos do leitor. É forte o seu sentimento de pai pelo único filho. Na situação-limite em que se encontra, luta desesperadamente contra a ideia de levar a criança à Roda dos Enjeitados. Daí sua “comoção enorme” ao avistar Arminda, a escrava fugitiva. Registram-se aqui duas fúrias: a “fúria de amor”, ao pegar o filho de volta X a fúria ao capturar a escrava. Depois de capturá-la e receber a recompensa, Cândido Neves reencontra o filho, beija-o, “entre lágrimas verdadeiras”, abençoa a fuga da escrava e não considera o aborto sofrido por Arminda. Daí sua frase final: “Nem todas as crianças vingam”. Frase compensatória, que justifica a crueldade da situação de quem tem o filho salvo enquanto a escrava perde o seu. E o recado de Machado de Assis fica claro: Cândido Neves adota o ponto de vista daquele que, sistemicamente, o subjuga, o submete à penúria financeira. Desloca-se da posição de dominado para a de dominador. Adere, despudoradamente, à posição do senhor que nunca foi. Enfim, incorpora a posição de um escravocrata.