>>>Assim falou Asas Lusco-Fusco >a insistente voz em minha cabeça:
>>>Literatura brasileira contemporânea >muitos medianos >poucos mediúnicos
>>>Umberto Eco >no ensaio Obra aberta >sugere que há basicamente dois tipos de escritor >>>1. O escritor que busca escrever os livros que o público quer ler (literatura-artesanato) >>>2. O escritor que busca formar um público para os livros que ele está escrevendo (literatura-arte) >>>Mas Umberto Eco não viveu o suficiente pra conhecer o terceiro tipo >>>3. A inteligência artificial >que veio estragar a dança das crianças >obrigando-as a voltar à fundamental pergunta >>>O que é literatura? >>>O que é arte? >>>O que é criatividade?
>>>Como saber se uma pessoa que se comporta virtuosamente é mesmo virtuosa >e não uma pessoa viciosa simulando uma virtude? >>>Como saber se uma pessoa que se comporta viciosamente é mesmo viciosa >e não uma pessoa virtuosa simulando um vício? >>>O problema das virtudes e dos vícios é análogo ao problema das inteligências artificiais >>>Alan Turing nos avisou que não importa o grau de sofisticação da tecnologia envolvida: hoje ou amanhã >jamais poderemos afirmar que determinada máquina é inteligente >>>Tudo o que poderemos afirmar >por meio do Teste de Turing >é que determinada máquina exibe um comportamento inteligente >>>Penso que o mesmo vale pras pessoas >>>A menos que desenvolvamos a habilidade da telepatia {sonho com isso há décadas} >em momento algum jamais podemos afirmar que determinada pessoa é virtuosa ou viciosa >>>Tudo o que podemos afirmar é que determinada pessoa exibe um comportamento virtuoso ou vicioso >>>É óbvio que essa conclusão atinge fortemente os textos literários >pobrezinhos >>>Os textos literários são expressões de um autor >uma forma de comportamento simbólico >>>Muitos leitores incompetentes adoram determinar o caráter nobre ou repulsivo de um autor >analisando as ficções e os poemas desse autor >>>E obviamente cometem os equívocos mais bizarros >>>Pessoas adoram simular virtude nas redes sociais e também >no caso dos escritores >nos livros que publicam >>>No jogo social nada impede que um escritor misógino >homofóbico >racista >fascista >imperialista {ou tudo isso} publique ficções e poemas politicamente corretíssimos >>>A página do Word e as livrarias aceitam tudo >até mesmo o oportunismo lucrativo >>>Se a proverbial “coragem de desagradar” dos modernistas não faz mais sucesso nem paga boleto >então >na arriscada busca por elogios e dobrões de ouro >praticar a fingida “coragem de agradar” parece ser uma estratégia mais eficiente >certo?
>>>Comigo >trabalho acadêmico >se não tiver sido escrito pelo ChatGPT >eu nem folheio
>>>Em breve >com o avanço da Inteligência Artificial >todo escritor se transformará no Amigo do Escritor >>>Explico >na hora do chope o Amigo do Escritor sempre aparece com uma “ideia genial” >por exemplo >pra um romance ou uma saga em cinco volumes >e passa uma hora fornecendo detalhes >tentando convencer o escritor a escrever a tal história >com o argumento óbvio de que “nós dois vamos ficar ricos, meu chapa”
>>>Uma avaliação cem por cento SINCERA de um livro >>>Quantos escritores realmente têm a coragem de querer? >>>Quantos leitores realmente têm a coragem de oferecer?
>>>Por conta do minicurso de férias Mundo-Vertigem: delírios da linguagem, decidi reler dois romances brasucas lançados há mais de vinte anos >Encrenca (2002), de Manoel Carlos Karam, e Adorável criatura Frankenstein (2003), de Ademir Assunção >>>Qual não foi minha surpresa ao encontrar >no final do texto das orelhas dessas duas obras-primas fora de catálogo >minha própria assinatura… >>>O que demonstra que o pronome possessivo MINHA >na frase anterior >não faz o menor sentido >>>MINHA de quem, mané?! >>>Há mais de vinte anos você nem existia >>>Tua memória está certíssima nessa natural traição >>>Quem escreveu aqueles textos foi OUTRO >>>Alguém que já deixou de escrever textos-de-orelha há muito tempo >>>Alguém-fantasma >que você nem chegou a conhecer em profundidade >>>{Falando sério >espero que não haja nenhuma relação de causalidade entre aquela assinatura e o fato de os maravilhosos Encrenca e Adorável criatura Frankenstein já estarem fora de catálogo >>>Mesmo assim >seu eu fosse vocês >pensaria duas vezes antes de me convidarem pra escrever um texto de orelhas}
>>>Quero ver o que vai acontecer quando o ChatGPT >ele mesmo >exigir pagamento de direitos autorais >>>No livro Homo Deus >Yuval Harari fala de IAs acionistas trilionárias que dominam o sistema financeiro internacional…
>>>Pretendem fazer um elogio literário? >Duas formas básicas >>>1. Aplaudir uma obra vaiando outras obras >Por exemplo: o conto Mandrake >de Rubem Fonseca >põe no chinelo tudo o que os epígonos já publicaram >E os epígonos de Rubem Fonseca sabem disso >>>2. Aplaudir uma obra sem desmerecer outras obras >Civilizadamente >É mais saudável >mais agradável… >Porém muito menos prazeroso >Vocês sabem >gostoso mesmo é escarnecer >Viva a vaia, galera >Yabba dabba doo! >É fogo no parquinho!
>>>Crítica literária é ciência ou pseudociência? >>> É certamente ciência >mas não uma ciência universalista >igual a física >a química e a astronomia >>>É uma ciência que sofre o peso da subjetividade do valor estético >tão volúvel >filho da inconstância da História >>>O que hoje é considerado sem importância amanhã poderá ser considerado fundamental >e vice-versa >>> Crítica literária é uma ciência cujas verdades (sempre provisórias) podem virar dogmas >e geralmente viram >como acontece na filosofia e na religião >>>Tomados todos os cuidados >crítica literária certamente é ciência >>>{Exceto para o doutor Sheldon Lee Cooper >prêmio Nobel de física >que não vê muita diferença entre crítica literária >design inteligente >astrologia >homeopatia e psicanálise}
>>>Encontrei minha função neste mundo >encher o saco dos cossacos >>>Torquato Neto diria >“desafinar o coro dos contentes” >>>Jamais serei um Torquato Neto >então vou de “encher o saco dos cossacos” mesmo
>>>Fazendo o quê? >>>Relendo o breve romance Papéis de Maria Dias >de Luci Collin >>>O que é a vida de uma pessoa? >>>Uma linha reta contínua em direção à morte? >>>Ou uma sequência descontínua de eventos que podem ser rearranjados ao sabor da memória aleatória? >>>Sendo assim, quantas personas-eventos aleatórias cabem numa pessoa-sequência descontínua? >>>Uma só Maria Dias ou cinco solitárias Marias Dias? >>>Ou uma atriz Maria Dias interpretando cinco papéis Marias Dias? >>>Nesse romance inventivo e muito divertido >Luci Maria Dias Collin espalhou cenas de cinco — ou de uma, ou de muitas outras? — personagens intrigantes >configurando múltiplos mistérios num jogo de esconde-esconde >>>Um romance fora da curva >mas não fora de catálogo >felizmente >>>Mays uma precyosidade da muy essencyal & dysparatada byblioteka do LunaLaby [Laboratöryo de Lyteratura Lunätyka]
>>>Um livro espantoso nos põe no centro do universo >>>Planetas >estrelas >galáxias distantes >durante a leitura tudo gira ao nosso redor