Hoje em dia pululam (acho que nunca tinha escrito esta palavra) concursos literários por aí. Isso é ótimo e péssimo.
Ótimo porque muita gente começa na literatura usando os concursos como desculpa. Eu mesmo fui um desses. Tinha vontade de escrever algo. Mas a lógica me dizia que seria inútil. Me parecia impossível ter um livro publicado. Então nem pensava seriamente em começar um romance ou um livro de contos. Me sentia hibernando como um urso, esperando a hora certa de acordar. E um concurso foi a desculpa perfeita. Eu disse para mim mesmo que só estava entrando na competição para ganhar algum dinheiro ou um troféu.
No caso, foi o Prêmio Oswald de Andrade de Dramaturgia. Era um concurso do governo estadual de São Paulo para textos de teatro. E havia um prêmio só para a região de Santos. Isso me animou. Eu não teria que concorrer com os sabichões paulistanos.
Nos meses seguintes escrevi uma peça chamada Sic transit gloria dei, onde Deus mandava um segundo filho à Terra: Cristóvão. E ele era bem mais liberal que o primogênito (tanto que tinha apostoletes em vez de apóstolos). Cristo ficou tão irritado que desceu dos céus e houve um grande duelo entre os dois irmãos.
Bem, ganhei o concurso. E isso foi um incentivo e tanto. Tanto que logo entrei em outro, o Nascente (disputado entre os alunos da USP), com um romance histórico sobre a independência do Brasil.
Estava cheio de otimismo. Mas não fiquei nem entre os dez finalistas.
Eu poderia ter desistido. Mas tive autocrítica e vi que minha história ainda não estava boa mesmo.
Para o ano seguinte reescrevi o livro, que viria a ser O Chalaça, meu primeiro romance. E dessa vez fiquei em primeiro lugar. Pena que bati meu carro alguns dias depois na Imigrantes, indo de São Paulo para Santos, e gastei todo o dinheiro no conserto do meu velho Del Rey.
De qualquer forma, vencer o Nascente me deu confiança para levar o livro para uma editora. Refiz o texto mais algumas vezes, deixei-o na recepção da Companhia das Letras (com uma carta de autoapresentação em que contava que havia ganhado o Nascente), gostaram e ele foi publicado. Para fechar com chave de ouro, O Chalaça ainda ganhou o Jabuti daquele ano.
Essas vitórias me fizeram acreditar que poderia mesmo ser um escritor.
Por outro lado, uma derrota num concurso pode ser uma pá de cal sobre as esperanças de um escritor iniciante. E às vezes essa derrota é só azar, não falta de talento.
Por exemplo, se na banca de jurados daquele meu primeiro prêmio de dramaturgia estivesse o atual ministro da Educação, certamente eu não teria vencido. E ele ainda tentaria fazer um exorcismo para expulsar o demônio que me havia feito escrever aquela blasfêmia. Talvez eu ficasse desanimado, não escrevesse O Chalaça e hoje ainda estaria trabalhando no jornal interno de uma fábrica de contêineres.
O escritor tem que saber que vencer um concurso depende um bom tanto da sorte, do acaso. Com uma banca julgadora, os vencedores são uns. Com outra, seriam outros. Uma derrota numa competição literária não quer dizer que uma obra seja ruim. Se bem que talvez ela seja mesmo. Aí é reescrever até que ela fique boa.
Outro problema dos concursos é que vários deles são apenas caça-níqueis. Geralmente são feitos por pequenas editoras que prometem a publicação dos vencedores. Porém, só o primeiro colocado entra na coletânea gratuitamente. Os outros têm que pagar. Ou seja, não era um concurso de verdade, mas uma esperteza da editora para ganhar alguns trocados. E o virgem escritor, cheio de vaidade e esperança, acaba caindo nessa.
Mas acho que esses concursos são poucos. Em sua maioria, eles são bem intencionados. E podem dar um empurrão aos tímidos e inseguros.
Falando nisso, tenho que parar o artigo por aqui, porque hoje é o último para um concurso (juro que é verdade!) e tenho que acabar minha inscrição.