Eu buscava obsessivamente uma identidade de escritor. Então, eu e dois amigos do Curso de Letras da Universidade Federal do Ceará, o Carlos Gildemar Pontes e o Sandoval Teixeira, infelizmente já falecido, fundamos o Folhetim literário acauã. Nele fazíamos entrevistas polêmicas, como a que Sandoval realizou com Raimundo Fagner, na qual o compositor e cantor criticava a cultura do Cariri cearense, chamando de “terroristas culturais” os que postulavam uma poesia mais engajada, à maneira de Patativa do Assaré. No Folhetim literário acauã publicávamos também nossos contos e poemas e ainda textos de autores cearenses. E procurávamos vender exemplares do Folhetim em eventos culturais da Universidade, em congressos e em bares. Eu fazia então, aos fins de semana, o percurso dos bares da avenida Bezerra de Meneses, carregando debaixo do braço exemplares do Folhetim. Após as vendas, eu parava para comer um hambúrguer no quiosque de um jovem poeta, magrinho, que fazia Letras na Universidade Estadual do Ceará e que gostava muito de poesia concreta. Eu já conhecia esse poeta do pátio da Letras da Universidade Federal do Ceará, onde por vezes ele passava distribuindo folhas com poemas seus. O jovem poeta, sempre afável, risonho, após eu me servir do hambúrguer cuja carne ele mesmo temperava em seu quiosque, trazia uma pasta, me mostrava os poemas dele. Eu os lia com prazer e gostava da forma inventiva como ele pensava a poesia. O jovem poeta migrou do curso de Letras para o Curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Ceará. E deixou de vender hambúrgueres. Tornou-se um jornalista muito conhecido no Ceará, editando o caderno de cultura de O Povo. E é, atualmente, um dos grandes biógrafos brasileiros, publicando seus livros pela Companhia das Letras. Chama-se Lira Neto e é o autor da renomada biografia, em três volumes, de Getúlio Vargas. Não sei se ainda escreve poemas concretos.