Escritor é aquele que, por ter publicado um romance, se habilita a palestrar sobre a vida dos afetos? É aquele que dá palpites sobre como sanar os apertos econômicos de um país? É o que aponta iniquidades morais e desliza para soluções suculentas? É o que pronuncia desforras contra os poderes de plantão? Não. O escritor se realiza antes é no texto, na linguagem. É no texto que ele arranja os seus sentimentos e pensamentos que, se bem expressos, se bem organizados numa estrutura, numa forma, vão calar fundo no leitor de várias gerações. A linguagem, e não o tema em si, é que faz a obra perdurar. O fim de toda escrita literária é encontrar uma forma eficaz de dizer. O escritor verdadeiro mergulha, sempre e sempre, na linguagem. Debruça-se, o tempo que lhe for necessário, até semanas, para produzir um único parágrafo. Procura obsessivamente encontrar o melhor ritmo, a imagem inusual, a palavra que dá orgulho à frase, o parágrafo que se veste de brilhos.