Anotações sobre romances (8)

O grande Gatsby (1925), de F. Scott Fitzgerald, não é só um romance da posse (ou da pose) e da tragédia, mas também da obstinação
F. Scott Fitzgerald, autor de “O grande Gatsby”
01/04/2014

O grande Gatsby (1925), de F. Scott Fitzgerald, não é só um romance da posse (ou da pose) e da tragédia, mas também da obstinação. A obstinação de um homem (Jay Gatsby) por uma mulher (Daisy). Mas obstinação conduzida com mistério, com engenho narrativo. E o leitor fica de fato abatido/absorvido pela força de uma paixão. Gatsby, o protagonista, ainda jovem, conhece a rica Daisy — e se apaixonam. Ele segue para a guerra como oficial e, ao retornar, Daisy está casada com o também rico e impetuoso Tom Buchanan. Gatsby, emblema da prosperidade e do hedonismo americano no pós-Primeira Guerra, ganha fortuna e adquire uma bela e espaçosa mansão de frente à baía à beira da qual está localizada a mansão de Daisy. A origem da fortuna de Gatsby é às vezes dissimulada no enredo por Nick Carraway, narrador da história, mas as pistas são dadas e indicam ações ilícitas (contrabando). Nick é um vizinho de poucas posses de Gatsby — os dois tornam-se amigos e confidentes. É através dele que Gatsby busca se reaproximar de Daisy (esta é prima em segundo grau de Nick). No romance, a casa de Gatsby torna-se um personagem — ela é símbolo do desfrute, da gastança, da boa vida. É nela que Gatsby promove grandes festas para gente rica e influente, regadas por muita bebida. E por quê? Porque pretende reconquistar Daisy e, para atraí-la, busca exibir-lhe o seu poder material. A posse é, no livro, um valor supremo. Quase tudo gira em torno do dinheiro. Menos a força mesma da paixão que Gatsby sente por Daisy. Por sua vez, as pessoas que frequentam as festas do protagonista estão interessadas em usufruir o que de melhor ele oferece, desregrando-se na bebida e no luxo. As pessoas que o frequentam Gatsby são políticos, empresários, esportistas — um “clã chamado Blackbuck”, um “importador de tabaco”, um “senador pelo Estado”, indivíduos “ligados ao cinema”, “gente de teatro”, etc. Para essas pessoas, Gatsby vale pelo que tem — é signo do hedonismo em si. E para Gatsby elas valem pelo que representam na escala social.

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Rinaldo de Fernandes

É escritor e professor de literatura da Universidade Federal da Paraíba. Autor de O perfume de Roberta, entre outros.

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