O horror, o horror…

O cenário da literatura de horror brasileira contemporânea revela uma surpreendente diversidade de vozes e abordagens
Irka Barrios, autora de “Júpiter Marte Saturno” e “Vespeiro”
13/11/2024

As letras brasileiras não são feitas apenas de finais felizes. O cenário da literatura de horror brasileira contemporânea revela uma surpreendente diversidade de vozes e abordagens. De contos insólitos a romances distópicos, passando por terror psicológico e “body horror”, autores e autoras nacionais têm explorado diferentes vertentes do gênero com criatividade e originalidade.

Começo por Verena Cavalcante, com seu Inventário de predadores domésticos, que traz um diferenciado olhar das crianças em narrativas de horror. Úrsula Antunes apresenta narrativas insólitas em Desilusão de ótica, enquanto Juliana Cunha explora a noite em Notívagas. Duda Falcão transita entre terror e fantasia, com especial apreço pelo universo “pulp”, território onde também encontramos os trabalhos de Oscar Nestarez.

No território do insólito, Fred Toscano se destaca com O rinoceronte na parede, obra semifinalista do Prêmio Oceanos 2023. O horror regional ganha força com Roberto Beltrão, referência do Recife assombrado, e Cristhiano Aguiar, cujo Gótico nordestino gerou importante movimento de divulgação do horror brasileiro.

Larissa Prado desponta como uma das vozes mais versáteis do gênero, abordando desde violência doméstica até horror cósmico, incluindo surrealismo e bruxaria. Cesar Bravo consolida sua presença com diversos livros de contos, enquanto Marcio Benjamin impressiona com Sina, uma obra híbrida que mescla contos e romance, trazendo musicalidade e lendas nordestinas. Sinara Foss contribui com contos que abordam a condição feminina e questões ambientais.

Na vertente distópica, Colapso, de Roberto Denser, destaca-se pela crueza e violência, tendo sido semifinalista do Prêmio Jabuti. Verde gás, de Ricardo Oliveira, e Sentinela, de Juliane Vicente, complementam esse subgênero. Porco de raça, de Bruno Ribeiro, embora não estritamente distópico, traz elementos do gênero em sua narrativa sobre lutas clandestinas.

O horror policial encontra expressão em obras como Roxo de Andrea Berriell e Urutau, de Larissa Brasil, esta última um fenômeno do mercado independente. Claudia Lemes firma-se como referência nesta intersecção entre horror e policial.

No universo dos vampiros, André Vianco mantém uma sólida base de leitores, enquanto o horror ambiental ganha força com Gritam pássaros em fuga, de Vanessa Amaral, que aborda questões de mineração e escravidão. No “true crime”, Paula Febbe estabelece-se como referência.

O “terrir” (terror com humor) encontra representação em Canção das adagas, de Daniel Freitas.

Last but not least, Daniel Gruber que desponta como um dos grandes nomes do horror brasileiro, tanto em contos, como em romances.

Outros autores importantes incluem Jaime Azevedo, Gutemberg Löwe, Iza Artagão, Mia Sardini, Jessica Gonzatto e Carolina Mancini, demonstrando a amplitude do gênero no Brasil.

A rica produção demonstra que o horror brasileiro transcende os clichês, estabelecendo diálogos profundos com questões sociais, ambientais e existenciais de nossa época.

Esta é apenas uma seleção da vibrante cena do horror nacional. Há muitos outros escritores e obras importantes que merecem atenção dos leitores.

Ajudou-me nesse garimpo, a autora Irka Barrios que leio há tempos. Seus Júpiter Marte Saturno e Vespeiro são notáveis, em especial no estilo “body horror”.

Em outras palavras, as narrativas de horror podem não ter finais felizes, mas a literatura de horror brasileira, com esse início, terá.

Carlos Castelo

É jornalista e escrevinhador. Cronista do Estadão, O Dia, e sócio fundador do grupo de humor Língua de Trapo. É autor de 18 livros.

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