A literatura nos ensina sobre a importância das metáforas. Os textos que as trazem são mais ricos, pois, ao associarem ideias diferentes, conseguem transmitir as mensagens de forma mais impactante e criativa. Usando simbologia rica nas frases, tornamos as sentenças mais profundas, complexas, e assim fugimos ao chavão, escapamos do lugar-comum.
Quando Rubem Alves afirmou haver “escolas que são gaiolas e outras que são asas”, construiu, com poucas palavras, toda uma reflexão sobre o sistema de ensino. Imediatamente recuei no tempo e analisei o colégio onde estudei. Certamente era uma gaiola. Lá quase não voávamos. As regras eram rígidas, os alunos basicamente precisavam cumprir uma série de obrigações estabelecidas, acordos muitas vezes tácitos, segundo os quais obedecer, tirar boas notas, comportar-se bem e ser asseado, eram os principais objetivos. Nunca exigiram pensamento crítico. E é ele, não o Red Bull, que nos dá asas. A cobrança não existiu por não ter havido esforço, em sala de aula, para fazer os alunos refletirem a respeito de assuntos sérios capazes de formar com qualidade os estudantes. Não me lembro de ter discutido sobre questões de gênero, sexo, política, meio ambiente, racismo. Havia trigonometria, os afluentes dos rios, a relatividade de Einstein, pronomes e conjunções, tabela periódica, o ciclo da cana de açúcar. Tudo lido e repetido exatamente como estava colocado na ficha do professor. Sem margens para escapar muito dos conceitos explanados. Em época de ditadura militar, a nossa instituição particular, conservadora e simpática ao governo, não considerava estratégico estimular o raciocínio dos jovens. Poderia ser perigoso, melhor nos deixar enclausurados. E assim, agora usando metáforas minhas, permanecemos na escuridão, nunca fomos iluminados.
Nas classes por mim frequentadas naquela organização de origem italiana, adepta de um ideário próximo ao existente na Itália, década de quarenta do século 20, jamais analisaríamos a alegoria explicitada por Vinicius de Moraes em A rosa de Hiroshima. Os meninos do meu tempo, com suas calças cinza e camisas brancas, certamente considerariam ser uma flor local típica do Japão. Não seriam convidados a refletir sobre a rosa radioativa, a rosa hereditária. Impossível o mestre investir sobre temática tão revolucionária. Preferiria ficar com José de Alencar e Iracema, a virgem dos lábios de mel. O amor romântico sim, um lago de águas tranquilas. O bom das metáforas é que chegam sem aviso e nos surpreendem.
Aliás, a gente sequer refletiu sobre essas figuras de linguagem capazes de comparar dois textos de forma implícita. Cantávamos encantados as músicas da Jovem Guarda achando os versos naturais:
— Se você pensa que meu coração é de papel…
Ouvíamos e acompanhávamos Bobby de Carlo na canção:
— Você é o tijolinho que faltava na minha construção…
Sem perceber haver ali uma das metáforas mais idiotas já escritas. Tão ridícula que chegava a ser hilária.
Longe da escola, em casa, a gente conversava e criava asas. E eu me encantava com as letras de um sujeito chamado Sidney Miller, principalmente aquelas cantadas pelo MPB4:
O cientista inventa uma flor que parece
A razão mais segura pra ninguém saber
De outra flor que tortura, pois é pra quê?