Retornar ao lugar de origem; ao lugar da poesia, àquele que nos habita desde a hora inicial. Devemos sempre regressar ao local que nos dá a vida, o sopro vital, onde se encontra o alimento, para seguir caminhando com integridade, com dignidade, no bosque dos nossos devaneios, de onde avistamos o mundo, que sobeja lá fora, de forma privilegiada.
Só é convidado ao templo do sagrado aquele que foi devidamente escrutinado, escolhido à entrada, e devidamente despido. Com novas vestes, o nosso objeto de desejo retornará ao mundo dos vivos, sem que estes desconfiem dos processos de escrita pelos quais passou. Afinal, o nosso objeto é aquele que nos olha de fora, e que quando nos lê nem sempre se reconhece no reflexo, não se vê por dentro. O poeta necessita de ser livre para ver com olhos novos, com uma visão diferenciada e, portanto (…) com olhos analfabetos (…). Escrever, mesmo que voltemos ao tema recorrente, é recomeçar.
A poeta Ana Paula Jardim regressa sempre a este lugar primeiro, o seu jardim particular, de alma limpa, sem ceder a modismos ou a visibilidade fácil que deles advêm. “Eu recuso-me a este cenário, quero ser inteiramente livre no meu lugar de criação, não quero ser como muitos que falam do mesmo, não falando de coisa nenhuma.”
Entre vários exemplos cita, em particular, a questão do feminismo; lembra que este universo sempre esteve presente na história da humanidade, nos clássicos, na mitologia, ou em muitas histórias que povoam o nosso inconsciente coletivo e, agora, o tema é tratado por alguns como se tivessem descoberto a pólvora.
Traz Antígona à vida, e diz da sua insubmissão ao poder, às leis humanas, quando contraria Creonte, ao não deixar o corpo do seu irmão sem os ritos sagrados, ao relento, à mercê das aves de rapina e dos cães. Antígona prefere cumprir as leis dos deuses, e paga com a morte por desobedecer ao rei de Tebas. Para além das várias leituras que se possam fazem deste clássico, esta personagem abre de forma inequívoca a discussão sobre as mulheres em todos os tempos. “Antígona para mim tem uma representação do feminino com a qual eu me identifico e que regresso sempre.”
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