A temática gay sempre permeou a produção literária de Silviano Santiago. Nesta coletânea publicada pela primeira vez em 1996, o escritor mineiro reĂşne cinco contos erĂłticos abertamente gays — o que já havia feito nas histĂłrias de O banquete, de 1970, quando ainda residia nos Estados Unidos, bem como naquele que talvez seja seu romance mais famoso, Stella Manhattan, de 1985. Em Keith Jarrett no Blue Note, cinco mĂşsicas de jazz nomeiam os cinco contos da obra. A estadia no estrangeiro, o sentimento amoroso e erĂłtico, a dĂşvida existencial marcam a tonalidade variada das histĂłrias. As folhas secas na calçada que ninguĂ©m se lembrou de recolher, a revista pornográfica, a comunicação interrompida, a angĂşstia da voz do outro lado do telefone, a pessoa amada que morreu — notas de alguns contos deste livro, em que a vida no estrangeiro pulsa no desencontro, no desejo e na incerteza. Numa atmosfera intimista, as paixões homoafetivas de personagens envolvidos com as lembranças de experiĂŞncias passadas desenham-se sutilmente. A solidĂŁo e os vĂnculos afetivos sĂŁo submetidos ao arranjo jazzĂstico de Silviano Santiago para compor uma coletânea que mescla a quietude ao som em tempos variados. Guiado pelo piano de Keith Jarrett, Santiago evoca literalmente uma apresentação do famoso jazzista no clube nova-iorquino Blue Note. Numa cidade provinciana americana, em Ipanema ou Copacabana, os personagens vivem momentos importantes da vida amorosa, amoldando-se Ă s linhas melĂłdicas de clássicos da canção popular. “Que o leitor nĂŁo se engane se pensa tratar-se este volume de uma reuniĂŁo de contos sobre relacionamentos homoafetivos estrito senso. Nele nĂŁo existem papĂ©is sexuais muito definidos”, escreve HeloĂsa Teixeira sobre os contos de Santiago. “SĂŁo improvisos que tĂŞm como leitmotiv uma permeável disponibilidade para o sexo. Assim como um meio espelho atravĂ©s do qual fossem refletidas construções recorrentes de um eu que dissesse vocĂŞ. Assim como no jazz se define o scat singing: a rĂ©plica vocal de um instrumento de sopro; a voz mimetizando um instrumento. Sem palavras.” Um dos autores mais celebrados da literatura brasileira contemporânea, Silviano Santiago tem uma obra extensa, que abarca uma grande gama de gĂŞneros, como o ensaio acadĂŞmico, o conto, o romance e a poesia. Paralelamente Ă carreira de escritor, construiu uma trajetĂłria brilhante na academia, tendo estudado na França nos anos 1960 e engatado uma carreira de professor universitário nos Estados Unidos, onde atuou na Rutgers University, do estado de Nova JĂ©rsei. Foi “Associate Professor with Tenure”, na State University of New York at Buffalo. Regressou ao Brasil, onde lecionou literatura brasileira e teoria literária na PontifĂcia Universidade CatĂłlica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) atĂ© 1980. Transferiu-se entĂŁo para a Universidade Federal Fluminense, em NiterĂłi, onde se aposentou como Professor EmĂ©rito. Nos Ăşltimos anos lançou romances instigantes, como Mil rosas roubadas, vencedor do PrĂŞmio Oceanos, e Machado, que ganhou o PrĂŞmio Jabuti. Em 2022, pelo conjunto de sua obra, recebeu o PrĂŞmio Camões.