“a intenção inicial deste livro era ser poço, mas virou espelho e agora vai ser gelo”, diz a voz que narra o romance criogenia de D. ou manifesto pelos prazeres perdidos, do carioca Leonardo Valente, lançado pela Mondrongo.
Não se sabe se é um homem ou uma mulher a contar suas desventuras, em tom que resvala no escárnio e na normalização do absurdo, mas há algumas possíveis certezas sobre o universo narrado: há cinco maridos no passado da personagem, todos chamados Damião, e um catecismo que não lhe impediu de seguir pecando.
Seja como for, a voz anuncia, “minto tanto que às vezes não sei diferenciar a realidade do que inventei. (…) minto para mim antes de mentir para qualquer outro, mas também minto para fora”. Nesse jogo de sombras, fica por conta do leitor a crença que será depositada na história.
Além da narrativa complexa, o livro joga com os elementos gráficos para incrementar a narrativa. Há páginas inteiras que trazem somente a palavra “pausa” ou “foda-se”, por exemplo, e outras em que o texto está centralizado — “centralizo, pois é importante”.
“Uma narrativa repleta de referências e perfeitamente integrada, mas que consegue descrever a desintegração pela qual estamos passando. Genial”, anota Maria Valéria Rezende em um dos comentários na quarta capa.
Leonardo Valente nasceu em Niterói (RJ), em 1974. Publicou os livros O beijo da Pombagira (2019) e Apoteose (2018). No ano passado, lançou Calote e foi um dos organizadores da coletânea Antifascistas.