Se a permanĆŖncia do livro Ć© volta e meia questionada, e hĆ” quem diga que a auto-publicaĆ§Ć£o Ć© a nova revoluĆ§Ć£o na Ć”rea, olhar para as publicaƧƵes da GeraĆ§Ć£o MimeĆ³grafo ouĀ MarginalĀ pode contribuir para se pensar esses movimentos atuais.
A exposiĆ§Ć£oĀ Poesia marginal – Palavra e livro, em cartaz no Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro atĆ© 10 de novembro deste ano, Ć© um bom comeƧo. Com curadoria do poeta EucanaĆ£ Ferraz, ela reĆŗne cerca de sessentaĀ publicaƧƵes, sobretudo livros da dĆ©cada de 1970, Ć©poca em que a poesia marginal teve sua grande expressĆ£o.
Como a alcunha jĆ” sugere, essa poesia ficava Ć margem das editoras: marcada pela incorporaĆ§Ć£o de elementos que iam desde a cultura pop, o futebol e as artes plĆ”sticas ao teatro, ela rompia com os limites tradicionais do gĆŖnero, usando versos insolentes e a fala cotidiana.
Para fazer circular e viabilizar a ediĆ§Ć£o de sua poesia, Ana Cristina Cesar, Cacaso, Chico Alvim, Chacal, Zuca Sardan e vĆ”rios outros inventavam e trocavam mĆ©todos: mimeĆ³grafo;Ā estĆŖncil; xerox; ofsete; grampos em vez de costura; envelopes e sacos em vez de encadernaĆ§Ć£o; papĆ©is de baixo preƧo e considerados toscos; impressĆ£o em, no mĆ”ximo, duas cores; carimbos.
Mais do que ser a forma possĆvel, o livro entĆ£o construĆdo tinha relaĆ§Ć£o direta com a poesia que se fazia Ć Ć©poca: ā(…) opunha-se de cara ao livro caro, ao objeto requintado da alta cultura, Ć s soluƧƵes caras do esnobe mercado editorial. O livro barato era um objeto polĆtico: antiburguĆŖsā, explica EucanaĆ£ Ferraz, curador da exposiĆ§Ć£o.
Apesar de seu āaugeā ter acontecido nos anos 1970, pode-se pensar em poetas como Zuca Sardan (que recentemente lanƧouĀ XimerixĀ pela Cosac Naify), que jĆ” tinham as principais caracterĆsticas da poesia marginal na dĆ©cada de 1950.
Ximerix, aliĆ”s, faz pensar se a poesia marginal ainda nĆ£o estaria aĆ, ao guardar tanto elementos caros ao autor — como o humor que faz o leitor rir de personagens como condes, freiras e o comunismo, atĆ© se dar conta de que ri de si mesmo — quanto, no aspecto grĆ”fico e plĆ”stico, as caracterĆsticas dos panfletos que Sardan produzia hĆ” mais de quarenta anos. TambĆ©mĀ Nicolas Behr, que publicou seus Ćŗltimos livros pela LĆngua Geral, ainda encontra em BrasĆlia sua musa/sĆ”tira inspiradora e conserva a verve quase de guerrilha contra determinados valores sociais, como se notou de sua participaĆ§Ć£o na Ćŗltima Flip.
A exposiĆ§Ć£o sobre poesia marginal fica registrada tambĆ©m em livro. O catĆ”logo traz artigo deĀ Frederico Coelho; texto do curador EucanaĆ£ Ferraz; portfĆ³lio das obras expostas; entrevista āPoesia hojeā, publicada em 1976, na revistaĀ JosĆ©,Ā com Heloisa Buarque de Hollanda, Ana Cristina Cesar, Geraldo Eduardo Carneiro e Eudoro Augusto; entrevista inĆ©dita com Heloisa Buarque de Hollanda e os poetas Chico Alvim, Chacal e Charles, mediada por EucanaĆ£ Ferraz, com a participaĆ§Ć£o do professor Eduardo Coelho; cronologia; e breve bibliografia.
AlĆ©m de retomar um importante movimento na poesia brasileira, Poesia marginal – Palavra e livroĀ deixa registrado muitos trabalhos que Ć Ć©poca nĆ£o encontravam a distribuiĆ§Ć£o e as tiragens de hoje, sendo atualmente rarĆssimos; e mostra um posicionamento frente Ć literatura e ao mundo extremamente atual.
SERVIĆO
Poesia marginal – Palavra e livro
VisitaĆ§Ć£o: de 10 de agosto a 10 de novembro de 2013
De terƧa a domingo, das 11h Ć s 20h
Instituto Moreira Salles no Rio de Janeiro (Rua MarquĆŖs de SĆ£o Vicente, 476, GĆ”vea)
Tel.: (21) 3284-7400/ (21) 3206-2500
Entrada franca – ClassificaĆ§Ć£o livre