O novo romance de Miguel Sanches Neto, Inventar um avô, faz um mergulho nos sentimentos da orfandade e mistura o real e o ficcional ao se aprofundar na história da imigração espanhola no Brasil. O livro será lançado no próximo sábado (29) em Curitiba, na Livraria da Vila (Pátio Batel Avenida do Batel, n. 1868 – Loja 314, piso L3), a partir das 18h.
O novo romance tambĂ©m marca os 30 anos de vida literária de Miguel Sanches Neto, que ao longo de sua trajetĂłria publicou de mais de 40 livros, em diversos gĂŞneros. Resultado de um grande trabalho de pesquisa de campo em cidades do interior e do litoral do estado de SĂŁo Paulo e tambĂ©m no Museu da Imigração de SĂŁo Paulo, Inventar um avĂ´ revisita as ondas migratĂłrias do inĂcio do sĂ©culo XX, em que cerca de 700 mil espanhĂłis desembarcaram no Brasil.
“O livro Ă© inspirado no fato de nĂŁo haver nenhum registro do meu avĂ´ espanhol em nenhum lugar”, explica o autor. “Nem mesmo nos documentos de imigração. Ele chegou ao Brasil em 1912 e desapareceu nos sertões paulistas, morrendo cedo. Tentei entender pela ficção como as famĂlias analfabetas que trabalharam nas lavouras de cafĂ© sofreram de uma invisibilidade muito rápida. NĂŁo sabemos nem onde meu avĂ´ está enterrado. Este romance Ă© um tĂşmulo ficcional para ele.”
Narrada em primeira pessoa, a obra se inicia com a atitude de um pai que batiza seus trĂŞs filhos com o mesmo nome. Quando questionado sobre a decisĂŁo, diz apenas que “naqueles tempos morriam muitas crianças”. ApĂłs a morte do pai, os trĂŞs irmĂŁos crescem cuidando da mĂŁe em uma casa povoada por bonecas. Esse ambiente familiar, marcado por uma rotina por vezes obscura, se desestabiliza quando o filho mais novo decide viajar para outra cidade. A partir daĂ, inicia-se a saga do narrador-protagonista em busca da prĂłpria identidade por meio da trajetĂłria de um avĂ´ espanhol sem histĂłria.
“É um livro que tenta ser um exercĂcio de delicadeza, mostrando como podemos descender de narrativas inventadas, que nĂŁo precisamos ter um passado palpável para nos representar. Toda pessoa que se interessa por recordações familiares vai encontrar nele uma maneira diferente de recuperar a saga dos imigrantes”, reflete Sanches Neto. “Meu avĂ´ foi um buraco na memĂłria familiar. O romance tem algo detetivesco, de tentativa de encontrar um desaparecido, este avĂ´ avesso Ă visibilidade. A sua invisibilidade principal Ă© de linguagem, por ter sido analfabeto. E o narrador tem que corrigir isso dando a ele uma histĂłria escrita. ”
Escrito entre 2015 e 2016, Ă©poca em que o autor morou em Portugal, Inventar um avĂ´ passou por mudanças na narrativa. ApĂłs muitas alterações, a obra perdeu o caráter autobiográfico e ganhou elementos ficcionais, e uma linguagem mais poĂ©tica. O livro marca tambĂ©m um perĂodo difĂcil na vida de Sanches Neto, que passou por um longo perĂodo de depressĂŁo.
“Nos Ăşltimos anos, passei por um processo depressivo muito agudo, que culminou em uma crise durante todo o ano de 2022. No momento mais crĂtico, decidi parar de escrever. Fui parando atĂ© de tomar notas nos diários que mantenho desde 2007, pois nĂŁo conseguia mais me entusiasmar com a escrita. A produção, principalmente de um romance, exige uma energia contĂnua e crescente, que me faltava naquele momento. Nos Ăşltimos dois meses eu venho superando a depressĂŁo e tenho feito isso por meio da escrita”, finaliza o autor.